Entre os destaques da sessão está a reserva de vagas para pessoas trans aprovada pelo Cepe. Em implementação, estima-se ingresso no 1º/ 2026
- Guilherme Marinho
A audiência pública discutiu os desafios enfrentados pela população trans e travesti no acesso à educação e ao mercado de trabalho. Foto: Raquel Aviani/Secom UnB
A Universidade de Brasília reafirmou compromisso com a inclusão e a equidade ao participar da audiência pública "Visibilidade Trans: Políticas afirmativas para superar a exclusão", realizada nesta quarta-feira (5), no plenário da Câmara Legislativa do Distrito Federal (CLDF). O evento, presidido pelo deputado distrital Fábio Félix (PSOL), reuniu lideranças acadêmicas, políticas e sociais para debater os desafios enfrentados pela população trans e travesti no acesso à educação e ao mercado de trabalho.
Uma das principais ações destacadas na sessão foi a aprovação, em 2024, da reserva de 2% das vagas em todos os cursos de graduação da UnB para pessoas trans, medida deliberada pelo Conselho de Ensino, Pesquisa e Extensão (Cepe) da Universidade. A reitora Rozana Naves lembrou que a UnB tem um histórico de protagonismo na adoção de políticas afirmativas. Ela também defendeu a importância da ampla participação da comunidade universitária na aprovação das cotas trans. “Esse foi um processo de discussão interna que mobilizou as unidades acadêmicas e levou para dentro da Universidade esse debate. Agora, estamos trabalhando para garantir a implementação dessa política ao longo de 2025, com ingresso previsto para 2026”, afirmou.
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Além da reserva de vagas, a UnB promove medidas de acolhimento e permanência estudantil para a comunidade trans. Rozana Naves elencou iniciativas como a Diretoria da Diversidade (DIV), vinculada ao Decanato de Assuntos Comunitários (DAC), e o projeto de extensão Vivências, que promove o enfrentamento à LGBTfobia na instituição. “Temos ações nos três campos fundamentais: acolhimento, permanência e extensionalidade. Nosso objetivo é levar essa discussão para fora da Universidade e mobilizar a sociedade em prol dessa pauta”, acrescentou.

Durante a audiência, foi ressaltado que a evasão escolar é um dos principais desafios enfrentados pela população trans, muitas vezes impulsionada pela transfobia e pela falta de suporte institucional e familiar. Para reverter esse cenário, parlamentares, gestores e ativistas defenderam a necessidade de políticas públicas mais robustas para garantir a inclusão dessa população no ensino superior e no mercado de trabalho.
O deputado Fábio Félix celebrou a decisão da UnB como um marco para o Distrito Federal e reforçou a necessidade de expandir políticas afirmativas. “A UnB deu um passo fundamental ao aprovar a reserva de vagas para pessoas trans. Precisamos garantir que essa ação inspire outras instituições a fazerem o mesmo. O acesso à educação é um direito e não pode ser negado por preconceito ou discriminação”, destacou.
Primeira pró-reitora trans do Brasil e pró-reitora adjunta de Assuntos Estudantis da Universidade Federal Rural do Rio de Janeiro (UFRRJ), Joyce Alves pontuou as conquistas na UFRRJ. “Em 2023, conseguimos aprovar cotas para trans na pós-graduação, sendo a primeira universidade do Rio de Janeiro a regulamentar essa ação afirmativa. Em 2024, ampliamos para a graduação. Foi uma conquista articulada entre reitoria, movimentos sociais, coletivos estudantis e sindicatos. Hoje, temos 23 universidades públicas no Brasil que já aprovaram cotas trans na graduação, e queremos que esse número aumente. Educação tem a ver com dignidade”, defendeu.
O representante do Instituto Brasileiro de Transmasculinidades (IBRAT), Kaleb Giulia, apresentou dados sobre a realidade das pessoas transmasculinas no país. “85% das transmasculinidades já pensaram ou tentaram o autoextermínio. É uma população que enfrenta graves exclusões nos sistemas de saúde e educação. No nosso mapeamento de educação, identificamos que 50% relataram desrespeito ao uso do nome social, 34% sofreram violência de docentes e 24% enfrentaram violências ligadas aos conteúdos didáticos, que ainda perpetuam noções ultrapassadas sobre gênero e biologia”, alertou.
Do coletivo Força Trans, Charllet de Jesus ressaltou a importância da garantia de direitos fundamentais para a população trans e travesti. “Sabemos que a Constituição garante vários direitos: educação, saúde, alimentação, trabalho, moradia, transporte, liberdade e igualdade. No entanto, ainda enfrentamos muitos desafios para que esses direitos sejam plenamente assegurados para a nossa comunidade. A moradia, por exemplo, é uma pauta urgente. Muitas mulheres trans vivem em situação de rua ou são empurradas para a prostituição por falta de alternativas. Precisamos garantir que a população trans tenha acesso a habitação digna e oportunidades de trabalho. A educação também é um ponto fundamental, e é necessário que as coordenações de ensino participem desses debates para garantir que o respeito e a inclusão aconteçam desde a base até o ensino superior”, afirmou Charllet.