Processos que podem modificar o entendimento voltaram a pauta da Corte nessa quarta (28). A violência doméstica sofrida pelas mães pode ganhar relevância em decisões sobre sequestro internacional de crianças no Brasil.

 

Escrito por
Luana Barros Este endereço de email está sendo protegido de spambots. Você precisa do JavaScript ativado para vê-lo.
 
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Legenda: A saída do país de residência da criança sem autorização de um dos responsáveis legais é classificada como sequestro internacional de crianças
Foto: Unai Huizi Photography/Shutterstock
 

A violência doméstica sofrida pelas mães pode ganhar relevância em decisões sobre sequestro internacional de crianças no Brasil. O tema é pauta no Supremo Tribunal Federal, onde duas ações que questionam as regras aplicadas no País sobre o tema tiveram o julgamento retomado. 

A classificação é usada quando uma criança ou adolescente de até 16 anos é retirado do país onde reside sem autorização do outro responsável legal ou mantido ali sem esse consentimento. O Brasil segue a Convenção de Haia, acordo internacional assinado em 1980. 

Nela, a regra primordial é garantir o retorno imediato da criança ou adolescente ao país de residência habitual. Mas, e quando esse retorno pode ferir os direitos desta criança ou mesmo colocar a segurança dela em risco? Um levantamento da organização internacional Revibra, que acolhe brasileiras migrantes na Europa, realizado em 2023, mostrou que 88,1% das mulheres processadas por sequestro internacional dos filhos tinham denunciado o ex-companheiro por violência doméstica. 

"(Na Convenção de Haia) o que se buscava era regular situações nas quais o pai levava a criança ou adolescente para um país estrangeiro para obter uma decisão mais favorável de guarda a ele", explica Mariana Albuquerque Zan. "A partir da década de 1990 essas configurações se alteram. (...) A violência doméstica faz com que as mães venham para o Brasil com a criança para romper com o ciclo de violência doméstica contra ela e, muitas vezes, contra a criança". 

Mariana Albuquerque Zan é doutoranda em Direito pela Fundação Getúlio Vargas (FGV-SP) e advogada do Instituto Alana. A entidade atua como amicus curiae nos processos sob análise do Supremo Tribunal Federal

O que diz cada ação?

O Supremo julga duas Ações Diretas de Inconstitucionalidade (ADIs). A primeira delas, ADI 4245, é de 2009 e foi apresentada pelo antigo partido DEM — que hoje, após fusão com PSL, forma o União Brasil.

Nela, explica Mariana Albuquerque Zan, é questionada a "aplicação automática" da Convenção de Haia em casos em que há denúncia de sequestro internacional de crianças. Ou seja, que a criança ou adolescente não viaje ao país de residência habitual antes que haja uma avaliação cuidadosa.

"O principal pedido é que essa regra não seja aplicada imediatamente sem considerar as exceções previstas pela própria Convenção", explica. Como a Convenção de Haia passou a ter peso de lei no Brasil, desde a ratificação em 2000, as exceções também têm validade no país. 

São elas: 

  • Risco físico ou psicológico grave ou se colocar a criança em situação intolerável;
  • Consentimento posterior do responsável que ficou no país de origem;
  • Integração da criança ao novo país, caso faça mais de 1 ano da saída dela do país de origem;
  • Objeção da criança ou adolescente ao retorno;
  • Incompatibilidade do país de origem em relação aos princípios fundamentais e de direitos humanos do país de acolhimento. 

O problema é que, em diversos processos, a análise da Justiça brasileira não chega a entender quais eram as condições de vida da criança e do adolescente no país onde residia nem os motivos que ocasionaram a vinda para o Brasil.  

"A ação (no STF) vem para pedir que essa a regra do retorno imediato não seja aplicada automaticamente, que esse caso seja analisado antes dela ser aplicada. Por exemplo, que a criança não retorne imediatamente ao país para que depois do caso seja analisado".
Mariana Albuquerque Zan
Advogada do Instituto Alana

O segundo processo, originado da ADI 7686, foi ajuizado pelo Psol em 2024. Nela, o pedido é para que a suspeita de violência doméstica impeça o retorno ao exterior de crianças e adolescentes, mesmo que eles não sejam a vítima direta. 

"Hoje, a gente não tem essa hipótese como uma exceção na aplicação da regra do retorno imediato. (...) Ela argumenta que, embora a criança não seja vítima direta, no caso em que a mãe é a vítima da violência doméstica, que esse ambiente é violento, é tóxico, é um ambiente abusivo, que pode representar um risco grave para esta criança e para esse adolescente", reforça.

Ela pontua ainda a necessidade de ouvir a criança e o adolescente nestes processos, que interferem diretamente na vida deles. A advogada lembra inclusive que essa escuta se alinha com a Constituição Federal — na qual crianças são definidas como sujeitos de direito —, no Estatuto da Criança e Adolescente (ECA) e em legislação específica sobre o depoimento de crianças "em processos que lhes digam respeito". 

"Em todos os casos referentes à subtração internacional de crianças e adolescentes, é importante que essa criança seja ouvida, que essa criança participe desse processo", afirma. 

 

fonte: https://diariodonordeste.verdesmares.com.br/pontopoder/sequestro-internacional-de-criancas-por-que-o-stf-discute-regras-e-qual-impacto-para-as-mulheres-1.3654576

 


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