Giovanna Carneiro, MARCO ZERO em 16/11/2022, 18:05.
Crédito: Marlon Diego
O Centro Dom Helder Câmara de Estudos e Ação Social (Cendhec) lançou a pesquisa “Meninas por uma Educação com Igualdade”, que expõe dados sobre desigualdades de gênero na Educação. O objetivo do levantamento, que compõe uma das ações do projeto Na Trilha da Educação – Gênero e Políticas Públicas para Meninas, do Fundo Malala, é entender os efeitos das desigualdades de gênero na vida escolar de meninas.
Os resultados da pesquisa, realizada com 438 estudantes do ensino fundamental II das redes de ensino municipal público do Recife, Camaragibe e Igarassu, foram apresentados e durante o seminário “Meninas por uma Educação com Igualdade”, que aconteceu na manhã desta quarta-feira, na Universidade Católica de Pernambuco (Unicap). O encontro reuniu educadores, estudantes, representantes das secretarias municipais e gestores escolares dos municípios parceiros do Cendhec.
O levantamento mostrou que racismo, assédio, LGBTQIA+fobia, trabalho doméstico e falta de incentivo para a prática de atividades esportivas são problemas comuns apontados pelas adolescentes. Um percentual significativo (94%) das estudantes ouvidas quer que o tema da igualdade de gênero seja discutido nas escolas.
Coordenadora do Programa da Criança e do Adolescente e coordenadora adjunta da instituição, a cientista social Katia Pintor pontua a importância da pesquisa no combate às desigualdades: “Ouvir as meninas ajuda o Cendhec a ter elementos para fazer com que essas vozes sejam ecoadas e transformadas em ação, em políticas públicas que garantam direitos previstos na Constituição de 1988 e no Estatuto da Criança e do Adolescente”. Além da apresentação dos resultados, durante o seminário o Cendhec entregou às secretarias de Educação uma carta de recomendações produzida pelo centro, a partir da experiência do projeto.
Principais dados
Realizada entre março e setembro de 2022, a pesquisa foi dividida em dois métodos: quantitativo – por meio da aplicação de questionários; e qualitativo – através da formação de grupos focais. As adolescentes consultadas responderam ao questionário no método quantitativo. Já no método qualitativo, um grupo de 71 meninas participou de rodas de discussão sobre desigualdade de gênero e educação, sendo 35 estudantes matriculadas no fundamental II e 36 jovens que estão fora da sala de aula, com até 21 anos. Mães de estudantes, gestores e professoras também foram ouvidas durante o estudo.
O levantamento apontou que 31,5% das alunas já se sentiram incomodadas com atitudes e comentários de meninos. Dessas, 54,4% sentiu que havia maldade e segundas intenções; 53,8% não contou pra ninguém sobre essas atitudes.
Ainda de acordo com o estudo, uma a cada quatro meninas sofre preconceito em ambiente escolar. Segundo o levantamento, 26,9% das meninas entrevistadas dizem terem sido afetadas por algum tipo de prejulgamento e repúdio em suas instituições de ensino. Das vítimas, 38,1% atribuem a ação ao racismo: 27,1% por ter cabelo crespo/enrolado; 11% por ser negra.
Das meninas entrevistadas em Igarassu, Recife e Camaragibe, 59,1% responderam não saber o que é desigualdade de gênero, no entanto, 66% acham que meninas e meninos não têm os mesmos direitos na escola. Sete em cada dez afirmam que seus professores não discutem o tema em sala de aula.
Pedagoga do Cendhec e integrante da Rede de Ativistas pela Educação do Fundo Malala responsável pela realização da pesquisa, Paula Ferreira explicou que o enfrentamento às desigualdades de gênero é um desafio que precisa ser encarado pelas instâncias da educação. “Para combater as desigualdades de gênero no ambiente escolar é preciso que as três redes parceiras do Cendhec, e que participaram da pesquisa, possam pensar em ações e projetos para garantir uma educação mais inclusiva para meninas, principalmente negras e que estão em vulnerabilidade social. Esse levantamento oferece dados importantes para pensar nas melhores estratégias”, afirmou a pesquisadora.
Esta reportagem foi produzida com apoio do Report for the World, uma iniciativa do The GroundTruth Project.
Principais dados
- Perfil das estudantes ouvidas: 45,9% das entrevistadas têm 12 anos, 78% das entrevistadas são negras e pardas, 41% são evangélicas e 19,9% são católicas (60% cristãs).
- Desigualdade de gênero: Das meninas entrevistadas em Igarassu, Recife e Camaragibe, 59,1% responderam não saber o que é desigualdade de gênero, ao mesmo tempo, 66% acham que meninas e meninos não têm os mesmos direitos na escola. Sete em cada dez afirmam que seus professores não discutem o tema, porém 94,1% apontam que debater direitos de meninas e meninos é necessário.
- Falta de incentivo afasta meninas das atividades esportivas: Aproximadamente 60% das estudantes acreditam que existe preconceito em relação às meninas praticarem esportes. Segundo elas, este preconceito é demonstrado pelos meninos, que foram citados em 91,5% das respostas. Um percentual de 26,5% das estudantes afirmaram se sentirem desconfortáveis com comentários sobre suas roupas.
- Assédio na escola: A pesquisa apresenta que 31,5% (sendo 7,1% muitas vezes + 24,4% algumas vezes) já se sentiu incomodada com atitudes/comentários de meninos. Dessas, 54,4% (sendo 11,9% muitas vezes + 42,5% algumas vezes) sentiu que havia maldade, segundas intenções. 53,8% não contou pra ninguém sobre essas atitudes.
- Racismo: Uma a cada 4 meninas sofre preconceito em ambiente escolar. De acordo com o levantamento, 26,9% das meninas entrevistadas dizem terem sido afetadas por algum tipo de prejulgamento/repúdio em suas instituições de ensino. Das vítimas, 38,1% atribui a ação ao racismo: 27,1% por ter cabelo crespo/enrolado; 11,0% por ser negra;
- Saúde mental, educação e pandemia: Quase metade das meninas em idade escolar se queixam de ansiedade. A pesquisa apresenta que a maioria (48,9%) das meninas entrevistadas se diz, na maior parte do tempo, ansiosa.
Ao todo, 68,3% das consultadas sentiram que a pandemia afetou sua saúde emocional, 65,9% disseram que a tristeza as abalou no período, outras 27,8% conviviam com o medo de perder alguém.
Sem aulas presenciais, o desenvolvimento delas também sofreu um duro golpe. Os números mostram que 55,5% das meninas relataram ter dificuldades para participar de aulas remotas, 43,2% destas atribuíram à dificuldade de acesso à internet. Ainda segundo o levantamento, 48,2% afirmam ter percebido prejuízos importantes em sua aprendizagem durante a crise sanitária.
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Fotos: Marlon Diego