Quase lá: Boaventura de Souza Santos tenta jogada jurídica para atingir vítimas de assédio

Comunicado do Coletivo de Vítimas de situações de assédio e abuso no Centro de Estudos Sociais da Universidade de Coimbra lembra que "É muito evidente a repetição da estratégia defensiva dos homens acusados de assédio que vemos em vários casos ao redor do mundo."

boaventura pesquisadoras relatam denUncias

COMUNICADO

DO COLETIVO DE VÍTIMAS DE SITUAÇÕES DE ASSÉDIO E ABUSO
NO CENTRO DE ESTUDOS SOCIAIS DA UNIVERSIDADE DE COIMBRA


Em julho de 2024, na sequência do Relatório da Comissão Independente que, a partir da informação reunida, afirma existirem indícios de “padrões de conduta de abuso de poder e assédio por parte de algumas pessoas que exerciam posições superiores na hierarquia do CES”, o Centro de Estudos Sociais da Universidade de Coimbra deu conhecimento da instauração de um processo prévio de inquérito com vista ao apuramento de todos os factos concretos e seus agentes.

Fomos informadas que esse processo seguiria critérios rigorosos e todas as cautelas e prescrições legais para assegurar o direito ao contraditório e de defesa das pessoas denunciadas. As mulheres do Coletivo que se sentiram com forças para fazer nova denúncia, enviaram aos instrutores do processo nomeados pelos CES, tal como solicitado, relatos detalhados dos factos e farta documentação, indicando ainda um
número considerável de testemunhas.

No mês de agosto, depois de sermos ouvidas, foi-nos dado conhecimento de que os factos seriam apresentados às pessoas denunciadas para lhes assegurar o direito de se manifestarem antes das conclusões do processo, revelando, uma vez mais, preocupação com a garantia do direito à defesa e ao contraditório das pessoas denunciadas.

Da parte do Coletivo, estivemos sempre empenhadas em documentar de forma sustentada as nossas denúncias e seguimos os procedimentos estabelecidos, cumprindo o que nos foi exigido, quer pela Comissão Independente no ano passado, quer pelo grupo de pessoas instrutoras indicadas pelo CES este ano.

Entendemos que abdicar de se manifestar no processo prévio é um direito das pessoas denunciadas, mas nos causa estranheza Boaventura de Sousa Santos afirmar publicamente não ter conhecimento dos factos ao mesmo tempo que informa ter ido ao encontro dos instrutores do processo devidamente acompanhado de seus advogados para prestar depoimento.

É muito evidente a repetição da estratégia defensiva dos homens acusados de assédio que vemos em vários casos ao redor do mundo. Essa estratégia consiste em evitar afirmar de forma clara e contundente que nunca abusou ou assediou, procurando, desse
modo, assegurar que não cai em contradição com as provas que podem ser apresentadas pelas vítimas.

Os denunciados, com frequência, servem-se de expedientes deste género para tumultuar processos e confundir as informações, rejeitando qualquer resultado ou subvertendo a interpretação sobre os factos para criar uma guerra de narrativas. Dessa forma é possível que, mesmo depois de numerosas denúncias de diferentes mulheres, que nem se conheciam ou não tinham laços estreitos entre si, Boaventura de Sousa Santos afirmar que existe uma campanha orquestrada de difamação.

Esse tipo de afirmação neste momento, depois do relatório da Comissão Independente, não tem qualquer sustentação. Causa-nos espanto que, a esta altura dos acontecimentos, Boaventura de Sousa Santos continue a alegar que não conhece os factos, tampouco quem são as denunciantes e, ao mesmo tempo, informe que vai processar as mulheres que o denunciaram e que ingressou com ação com farta documentação para contestar a versão das denunciantes.

A estratégia de confusão e contradição nas suas declarações é deliberada, e visa reunir elementos para atacar as vítimas e a sua integridade, ignorando a realidade dos factos para criar confusão de informações e ofuscar o principal: são várias e de distintas origens as denúncias de assédio e dão evidências mais do que suficientes de um padrão de comportamento abusivo e predatório, especialmente dirigido contra as mulheres.

Até este momento, entendemos que os instrutores do processo prévio estão fazendo o seu trabalho, seguindo a legislação e os direitos das pessoas denunciadas, porque foi essa a preocupação que manifestaram desde o primeiro momento.

Quanto às notícias recentes sobre a ação judicial que Boaventura de Sousa Santos move contra nós, entendemos que o direito a acionar os tribunais deve ser garantido pelo Estado e é um direito humano. Boaventura de Sousa Santos sempre teve esse direito plenamente assegurado e à sua disposição. E o fato em si de ele acionar a justiça portuguesa e todos os meios e poder de que dispõe para processar as vítimas é prova
mais do que suficiente de que não está sofrendo qualquer processo injusto de lawfare, como sempre afirmou. Ao contrário, ele decidiu livre e plenamente empregar seus meios e influência para iniciar um processo de lawfare contra as vítimas. O lawfare ocorre quando os procedimentos legais são manipulados para o fim de perseguição e oposição a pessoas escolhidas como alvos.

Enquanto nos submetemos às regras e aos procedimentos das comissões criadas para apuração dos fatos, é Boaventura de Sousa Santos quem se se tem servido da influência e dos meios de que dispõe na expectativa de conseguir manipular procedimentos legais e subverter resultados que lhe são desfavoráveis, como o resultado do relatório da Comissão Independente, que reconheceu a existência do padrão de assédio e abuso.

Nenhuma das integrantes do Coletivo foi ainda citada formalmente de qualquer ação judicial e não conhecemos o seu conteúdo. Assim que tomarmos conhecimento formal da ação, tomaremos as medidas necessárias, como temos vindo a fazer, porque estamos falando a verdade, não podemos continuar a aceitar a normalidade de uma academia violenta e nenhuma de nós está sozinha.

2 de outubro de 2024,

O Coletivo
www.academiasemassedio.com

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