A Articulação de Mulheres Brasileiras vem a público manifestar sua defesa radical dos Ministérios da Mulher e da Igualdade Racial, reafirmando a importância destas pastas para a transformação da vida das mulheres e da população negra brasileira e para a consolidação da democracia no Brasil.
A Articulação de Mulheres Brasileiras vem a público manifestar sua defesa radical dos Ministérios da Mulher e da Igualdade Racial, reafirmando a importância destas pastas para a transformação da vida das mulheres e da população negra brasileira e para a consolidação da democracia no Brasil.
Nos manifestamos saudando e valorizando o acumulado das lutas que nos trouxeram até aqui, desde a resistência aos anos de repressão política, passando pela abertura democrática, a constituinte cidadã e a eleição direta para a presidência da república, no ano de 2010,da primeira mulher presidenta do Brasil, Dilma Rousseff.
A teoria política feminista, que intersecciona gênero, raça e classe, oferece chaves de leitura que nos alertam de que será lá, justamente nos espaços onde as mulheres exercem poder, que as estruturas patriarcais e racistas irão operar em toda a sua opressão e violência, desestabilizando, enfraquecendo e deslegitimando, tentando nos impor uma cidadania de segunda classe, desvalorizando o conjunto de nossas demandas e propostas por direitos e políticas.
Foi assim que vimos a presidenta Dilma Rousseff ser achincalhada nas bombas de gasolina, tendo sua integridade violentamente ferida. É assim que presenciamos, na atualidade, casos de denúncias, extremamente graves, por assédio moral e racismo, se tornarem força motriz de disputas internas, que fragilizam cotidianamente a credibilidade e a estrutura dos ministérios e das pessoas que os conduzem.
Diante dos ataques aos Ministérios da Mulher e da Igualdade Racial e da ausência de ações internas contra assédio no Poder Executivo Federal, como parte de suas políticas, vimos publicizar que estamos atentas ao cenário de constante instabilidade política que ronda esses ministérios. E, por esta razão, chamamos a atenção e cobramos compromisso do atual governo para a tomada das medidas cabíveis, amparadas em leis e normativas estabelecidas pelo Estado Brasileiro, para apuração e responsabilização das denúncias, bem como o estabelecimento de medidas preventivas contra as situações de assédio e racismo contra as funcionárias.
É imperativo que estas situações sejam enfrentadas exemplarmente nas estruturas da gestão pública, sinalizando para a sociedade brasileira que é urgente repactuar nossos modos de convivência e sociabilidade.
Humanizar as relações de trabalho nos serviços públicos para não colocar em risco o nosso projeto de transformação social
A sociedade brasileira não pode aceitar que o cancelamento e o justiçamento sejam formas de condenação. Estas práticas são antidemocráticas, se retroalimentam na política patriarcal, racista hierárquica, elitista, etnocêntrica e heteronormativa.
Não basta culpabilizar e condenar agressoras/es e se solidarizar com as vítimas. É preciso buscar a responsabilização e conscientização para poder mudar esta realidade. As instituições e as pessoas que as compõem precisam ser instadas a se responsabilizar, adotar medidas concretas, monitorar estas medidas para impedir e colocar limite a este tipo de conduta tão normalizada, tomar providências práticas para perceber, escutar, cuidar, acolher e processar o que a pessoa-sujeito diz-sente, não só no limite quando a pessoa já deixou de ser sujeito e se tornou vítima. Parar de colocar as coisas debaixo do tapete!
É importante considerar que as relações de trabalho no Brasil foram precarizadas com as insistentes reformas para desonerar os estados. A reforma trabalhista flexibiliza e piora os direitos de trabalhadores e trabalhadoras e isso tem trazido impactos. Na administração pública há funcionários e funcionárias que fizeram concurso público, mas também há aqueles em trabalhos terceirizados. Enquanto alguns disputam poder via cargos, imaginem a pressão e o assédio entre servidores em funções e cargos de quem é terceirizado?
Se faz urgente a promoção de uma outra cultura política, com sentido feminista e contra-hegemônica, que redefina a forma de lidar com conflitos, superando a lógica autoritária do “manda quem pode, obedece quem tem juízo” — tão alinhada com o racismo, o machismo e a cis-heteronormatividade.
Golpes, perseguições, estigmatização, discriminações, oportunismos, disputas pelo poder, fofoca, vitimização, e todo esse rol de condutas que em nada contribuem para a superação do problema, tampouco estabelecem uma nova cultura política. O que quer o feminismo antirracista, anticapitalista e contra colonial é transformar esse sistema!
Disputar projetos de sociedade, significa abraçar as causas de quem mais precisa contra aqueles que mais acumulam.
Em nossa avaliação é fundamental que o governo apure as denúncias e resguarde os referidos ministérios dos engenhosos mecanismos de desestabilização política de guerra híbrida, sobretudo diante dos recentes resultados eleitorais, que confirmam o avanço da extrema-direita no país e trazem impactos devastadores para as lutas feministas e antirracistas.
É necessário que o governo atue para de fato fortalecer o poder e a resolutividade dos ministérios na implementação de políticas que promovam justiça e direitos para todas as mulheres e população negra, garantindo-lhes um orçamento adequado.
Paradoxalmente à intensidade dos conflitos, o Ministério da Mulher foi proporcionalmente o mais afetado pelo contingenciamento do governo federal, no esforço de cumprir a meta fiscal de déficit zero. Um corte de 17,5% de uma previsão de R$ 471,6 milhões, com o desafio de uma campanha massiva para enfrentamento ao feminicídio, e meta de construção de 40 Casas da Mulher Brasileira até 2026. Também o Novo Arcabouço Fiscal contingenciou recursos da saúde e educação, o que em nosso entendimento não é o melhor caminho para equilibrar as contas do país, aplicando medidas que apenas aprofundam a precarização da vida.
O que os movimentos de mulheres e feministas, mulheres negras, povos indígenas, população LBT, denunciam e revelam são as estruturas de desigualdade que conformaram a nossa sociedade: gênero, raça e etnia, classe e a heteronormatividade, como parte da estrutura de dominação patriarcal, e que nos países alvos da colonização a violência opera como força reguladora.
Estes debates, e as lutas que deles decorrem, cresceram no Brasil nos últimos 30 anos, enraizando reflexões inquietantes e transformadoras sobre a estrutura colonial, patriarcal e racista do nosso país, preenchendo corações e mentes de novas gerações ávidas pelo Bem Viver e pelo direito de decidir sobre suas vidas.
E por essas lutas e por nossas vidas, não baixaremos a guarda! Seguimos atentas às tentativas de rótulos, aos esforços de esvaziamento de nossas demandas. Seguimos resistindo e defendendo as conquistas das lutas dos movimentos de mulheres no Brasil e no Mundo.