Ano Novo, Governo Novo e a velha luta pela igualdade

O ano de 2002 trouxe alegrias e novos horizontes. A criação da Comissão de Transição do Governo Lula abriu algum espaço de diálogo com os movimentos sociais e a oportunidade de apresentar propostas e sugestões de nomes para a equipe ministerial. Inúmeras feministas, setores e organizações dos movimentos de mulheres estão participando ativamente deste processo. Aproveitamos nosso editorial para reafirmar o posicionamento do CFEMEA frente ao momento atual.

Até o fechamento desta edição, não tínhamos a indicação de quem iria assumir a Secretaria de Estado dos Direitos da Mulher (SEDIM). Nesta questão, o CFEMEA não subscreveu nenhuma lista de apoio às candidaturas que foram colocadas, embora reconheça que os nomes levantados foram de mulheres comprometidas com a luta pela cidadania das mulheres. Nossa posição política foi de priorizar a defesa de estratégias de atuação junto aos interlocutores governamentais, perfis e compromissos para os mecanismos institucionais de defesa dos direitos das mulheres e de ampliar os espaços governamentais passíveis de intervenção pelo movimento feminista, visando a promoção da igualdade para mulheres e homens.

Em sintonia com esta visão e com o intuito de contribuir para o aprofundamento do debate, o CFEMEA elaborou o documento "Mecanismos Institucionais para a Defesa dos Direitos das Mulheres" que levanta uma discussão sobre o CNDM/SEDIM e encontra-se no nosso site. Outra contribuição foi a elaboração de documento, juntamente com o SOS Corpo (no âmbito da Secretaria Executiva da AMB), versando sobre uma intervenção estratégica no Plano Plurianual 2004/2007. Ambos os documentos foram entregues à Vera Soares, interlocutora com os movimentos de mulheres na Comissão de Transição.

Consideramos da maior importância a instauração de um amplo debate sobre os mecanismos institucionais para a igualdade de gênero, que possa considerar suas delimitações, atribuições e complementaridades.

De nossa parte, entendemos que os atuais mecanismos (CNDM e SEDIM) necessitam de mudanças substantivas para que possam promover e intervir nas ações governamentais de forma a diminuir as desigualdades entre mulheres e homens, bem como entre as próprias mulheres. Genericamente, pensamos que o Conselho Nacional dos Direitos da Mulher (CNDM), além de formulador de políticas públicas, deve atuar como um órgão de controle social e ser composto com representações das instâncias organizadas da sociedade civil. Quanto à Secretaria da Mulher, consideramos que deva ter a atribuição de intervir na definição das políticas públicas, acompanhá-las, monitorá-las e avaliá-las, considerando a perspectiva de gênero.

Sabemos das dificuldades que aguardam o novo Governo e temos consciência do imenso desafio de se realizar um desenvolvimento sustentável e com justiça social. Nossa herança de um passado escravocrata, colonialista e patriarcal é muito pesada e não podemos ter ilusões de que um governo democrático e popular, imediatamente, terá as condições de promover a igualdade e eliminar todo tipo de discriminação.

Contudo, também sabemos e defendemos que precisamos avançar no sentido de transformar a nossa realidade - um país considerado dos mais injustos e desiguais do planeta. Para diminuir essa vergonhosa situação, é importante que Governo e sociedade civil compartilhem responsabilidades. No momento, nossa maior responsabilidade enquanto sociedade civil é ser sujeito político ativo na definição das políticas públicas a serem implementadas pelo novo Governo, que devem ser estruturantes para mudanças radicais, e paralelamente, ampliarmos a nossa capacidade de monitoramento e avaliação dessas políticas.

Certamente, o novo ano nos colocará frente a muitas lutas e desafios. Será um ano de aprendizados cotidianos e precisaremos reafirmar sempre a política feminista que valorizamos: de transparência, de lealdade, de ousadia, de diálogo e pactuação, de respeito à diversidade, enfim, uma política democrática e solidária, detentora de um amplo projeto social e consciente de sua contribuição para a construção de um novo Brasil. Nessa construção e em sintonia com o olhar feminista, o fim não justifica os meios e os processos são tão importantes quanto os resultados a serem alcançados.


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