No Brasil, as diferenças - seja de gênero, raça, etnia ou geracional - quase sempre se traduzem em desigualdades. Os movimentos de mulheres e feministas têm se defrontado, cada vez mais, com estes múltiplos fatores produtores da discriminação e reprodutores da ausência de equidade.

Para o CFEMEA, assim como para outras ONGs e núcleos de pesquisa feminista, alguns conceitos utilizados de forma recorrente pelas ciências sociais e nos debates políticos como "força de trabalho feminina", "feminização da pobreza" "mulheres chefes de família" e "empoderamento das mulheres" soam demasiadamente neutros e genéricos para enfrentar a concretude das múltiplas formas de discriminação enfrentadas por 23% da população brasileira - as mulheres negras.

Para encarar seriamente o problema da desigualdade no Brasil, há que se enfrentar a interseccionalidade das discriminações de gênero e raça que estruturam as relações sociais em nosso país. Assumindo para si este desafio, há alguns anos o CFEMEA vem fortalecendo os vínculos com outras organizações da sociedade civil, notadamente de mulheres negras, a fim de enfrentar e denunciar as injustiças e as desigualdades decorrentes do racismo.

Além deste aprofundamento das relações políticas, a equipe do Centro também decidiu refinar conceitos, aprimorar os mecanismos e os instrumentos metodológicos de análise social sobre a interseccionalidade das discriminações de gênero e raça, buscando alternativas para efetivar a igualdade de direitos e a equidade no acesso aos recursos e benefícios do desenvolvimento.

No campo das políticas de desenvolvimento, tem sido especialmente desafiante participar das discussões sobre a construção de modelos alternativos, suscitadas em diferentes espaços, desde a posse do governo Lula. Muitas articulações de mulheres incorporaram-se aos Fóruns de Participação Popular para a consulta sobre o PPA - Plano Plurianual 2004/2007. Também participaram dos diálogos com o Ministério do Planejamento, com a Secretaria Especial de Políticas para as Mulheres e a Secretaria Especial de Políticas de Promoção da Igualdade Racial.

No debate com o Executivo, as organizações feministas e anti-racistas têm afirmado que todos os programas e projetos previstos no novo PPA, ainda que pareçam ter um caráter muito técnico ou neutro, terão implicações sobre as relações de gênero e étnico-raciais. Há que mensurá-las e revelá-las para o conhecimento e controle público. Entretanto, no governo, os recursos humanos e os instrumentos de monitoramento das políticas públicas, atualmente disponíveis, e os planejados para o futuro (até agora) continuam muito aquém desta necessidade. Há muito o que fazer.

Entendemos que a equidade de gênero e raça se constitui em elemento basilar de qualquer projeto de desenvolvimento, e não suplementar, como se fossem duas pitadinhas finais na receita do bolo.

Diálogos contra o Racismo

No Rio de Janeiro, quase todo mundo considera que o Brasil é um país racista; mas quase ninguém assume a responsabilidade por qualquer tipo de discriminação. Pesquisas de opinião apontam que 75% d@s brasileir@s reconhecem que há racismo no Brasil. Entretanto, 85% não se assumem como racistas. É muito difícil mudar uma situação pela qual ninguém se responsabiliza. Assumir "o pequeno e indesejável racista" que insiste em sobreviver dentro de cada uma/um de nós é um passo decisivo no enfrentamento da situação. Com este objetivo, várias organizações, redes e articulações envolvidas nos Diálogos contra o Racismo, irão lançar, durante este ano, uma campanha nacional de mobilização social anti-racista.

Os Diálogos nasceram no ano 2000, por iniciativa da Articulação de Mulheres Brasileiras (AMB), em meio ao processo preparatório da Conferência Mundial contra o Racismo. A sua primeira edição foi promovida conjuntamente pela AMB e Observatório da Cidadania. Desde então, anualmente reúne organizações dos movimentos negro, de mulheres negras, feministas, de defesa dos direitos humanos, além de centros de pesquisa.

Em 2003, na sua 4ª edição, os Diálogos sustentaram o desafio original de provocar a sociedade para enfrentar as injustiças e as desigualdades decorrentes do racismo. Além disto, visaram estimular a ampliação do trabalho das próprias ONGs e movimentos sociais nesta área, considerado ainda muito incipiente. @s participantes assumiram a tarefa de fortalecer o trabalho das suas próprias organizações/movimentos nesta área, bem como de sensibilizar e mobilizar outras organizações, que não pertencem ao movimento negro, para uma agenda anti-racista no Brasil.

Além do CFEMEA, as organizações que têm se destacado na condução dos Diálogos são o Ibase, SOS/Corpo, Inesc, Rede Dawn, Fase e Cedec, Centro de Estudos Afro-Brasileiros/UCAM, Comunidade Bahá’i, CESEC/UCAM, Geledés-Instituto da Mulher Negra, Redeh, Instituto Patrícia Galvão, Criola, Articulação de ONGs de Mulheres Negras, Articulação de Mulheres Brasileiras e ABONG - Associação Brasileira de ONGs.


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