Frente à divulgação da carta aos bispos da Igreja Católica sobre a colaboração do homem e da mulher na igreja e no mundo

É com indignação e tristeza que recebemos a carta divulgada pela Congregação para a Doutrina da Fé, para os bispos da Igreja Católica sobre "a colaboração do homem e da mulher", publicada em 31/07/04.

Indignação porque, enquanto todas as entidades e personalidades mundiais comprometidas com a construção de um mundo mais solidário, humano e democrático, estão considerando que é fundamental ter em conta as contribuições surgidas dos movimentos e das mulheres feministas do mundo inteiro, a Igreja Católica, instituição religiosa, cuja presença majoritária de fieis é composta por mulheres, mostra sua cara misógina e a falta de vontade de acolher as boas contribuições que vêm destas, divulgando uma carta que recrimina sem argumentos sérios as propostas surgidas do feminismo.

É triste e vergonhoso ler uma carta com imprecisões, ignorância e falta de clareza sobre as proposições do movimento feminista, quando ela emana de uma instituição eclesial que em alguns momentos da história tem dado uma contribuição valiosa e sábia para a humanidade.

Na carta, a igreja revela sua falta de humildade quando se auto-proclama "perita em humanidade", atitude que reflete a crença em que ela é a dona da verdade e tem a última palavra sobre estes assuntos. O que se percebe é o desejo profundo de uma igreja masculina que se sente no direito de decidir e escolher o que as mulheres querem ou devem fazer de suas vidas, sobretudo quando propõe, no documento, um modelo de mulher que tem como missão "sacrifício, sofrimento, passividade e doação para os outros". É exatamente esse modelo que tem trazido conseqüências negativas para as mulheres cristãs, como demonstram os estudos e pesquisas feministas, incluindo neles as teologias feministas.

Se a atitude da igreja fosse a de "ESCUTAR OS SINAIS DOS TEMPOS", como o principio evangélico sugere, ela acolheria as contribuições que o feminismo tem trazido não somente para as mulheres, como também para os homens, porque se uma parte da humanidade é negada, excluída, maltratada, toda a humanidade estará sendo afetada.

A igreja revela não querer ouvir os sinais dos tempos, quando desconhece as contribuições que o feminismo tem trazido também para as religiões. Porque, ao mesmo tempo em que o feminismo desvenda as responsabilidades das religiões na situação de subordinação das mulheres, também mostra as contribuições positivas que as religiões têm trazido para a vida das mulheres. Uma teologia que incorpore as experiências das mulheres, como estão propondo as teólogas feministas não é muito bem vinda para os homens do Vaticano. As mulheres de Igreja querem muito mais que continuar reproduzindo um discurso que perpetue e justifique, religiosamente, a subordinação das mulheres. Querem como construtoras de sua própria fé contribuir para a libertação das mulheres e isso, a carta não tem em conta.

Se a igreja fosse mais humilde, escutaria "AS VOZES DOS TEMPOS", de mulheres católicas que no mundo inteiro querem ver reconhecidos os direitos que têm como batizadas e confirmadas dentro da Igreja. Estes direitos elas conquistaram no mundo inteiro, quando com seu trabalho diário mantêm vivas muitas das comunidades cristãs.

Se a igreja tivesse vontade de ler "OS SINAIS DOS TEMPOS" entenderia que a diversidade familiar existe através da história humana e bíblica, como quando encontramos nos evangelhos um Jesus que rompe as tradições e escolhe outro modelo familiar, ao indicar os discípulos como uma nova família (Marcos 3:31). Ou quando escolhe como família Lázaro, Marta e Maria, um irmão solteiro vivendo com duas irmãs solteiras.

Se a igreja tivesse vontade e quisesse escutar o "CLAMOR DOS TEMPOS" abriria seu coração e abraçaria o que os feminismos estão anunciando: um novo céu, uma nova terra, onde homens e mulheres de todas as raças, de todas as cores, de todas as orientações sexuais, de todas as gerações, tenham igualdade de condições.

Ainda continuamos esperando uma palavra de denúncia e solidariedade da igreja sobre os séculos de discriminação e exclusão que sofremos, tanto na sociedade como na igreja.

Ainda continuamos esperando uma voz de compromisso e denúncia da Igreja, pelos altos índices de violência sofrida pelas mulheres.

Ainda continuamos esperando uma palavra pública de solidariedade e acolhida às muitas religiosas que no mundo inteiro sofreram abuso sexual por parte de padres, como noticiou o National Catholic Report, em 16 de março de 2001.

Ainda continuamos esperando uma atitude de compromisso e justiça para com as mulheres, crianças, adolescentes que no mundo inteiro têm sofrido abuso sexual por parte de padres.

Ainda continuamos esperando, que leiam OS SINAIS DOS TEMPOS !!!!


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