No Governo Lula as receitas estão crescendo mais rapidamente que as despesas e com isso gerando resultados fiscais superiores aos verificados no ano passado. Em 2004, o superávit primário, que é a diferença entre receitas e despesas, não sendo incluídas as despesas com juros, foi de 4,08% do PIB até junho, enquanto neste ano, no mesmo período, já alcança 4,26%.
Mas, apesar destes resultados, o Governo não dá sinais de "afrouxamento" do rígido controle das despesas. Pelo contrário, vários setores apostam num aperto ainda maior. Após o surgimento da proposta de déficit nominal zero1, rechaçada por vários segmentos da sociedade, surge agora a proposta de elevação da meta de superávit primário para 5% do PIB.
Quem mais perde com isso é a população beneficiária das ações públicas que são consideradas "contingenciáveis", ou seja, ações que não estão protegidas por vinculações constitucionais ou obrigações legais, e que, portanto, são passíveis de contenção.
Os programas desenvolvidos pela Secretaria Especial de Políticas para as Mulheres (SPM) estão entre eles. O órgão Presidência da República, ao qual está vinculada a SPM, deve ampliar de R$ 566,7 milhões, o limite de comprometimento de despesas estabelecido até agosto, para R$ 755,6 milhões, ou seja, um crescimento de 33,3% até dezembro, segundo o Decreto 5.449/2005. Em 2004, foram realizadas despesas em valores próximos a R$ 698 milhões da "base contingenciável" da Presidência da República2.
Como reflexo, segundo a Portaria 144/PR, os três programas a cargo da SPM ficaram a mingua. De um total de quase R$ 18,5 milhões autorizados na Lei Orçamentária 2005, foram contingenciados ou não puderam ser comprometidos até agosto, 68,4%, restando para a execução das políticas públicas neste período apenas R$ 5,8 milhões.
Execução Orçamentária da SPM até Julho/2005
Ação (Cod/Desc) | Autorizado | Contingenciado | Limite Autorizado até Ago/2005 |
Empenhado | Liquidado | Pago |
1068 - Gestão de Política de Gênero | 5.155.209 | 3.389.013 | 1.766.196 | 1.597.240 | 901.053 | 901.053 |
1087 - Igualdade de Gênero nas Relações de Trabalho | 3.183.872 | 2.458.414 | 725.458 | 671.997 | 131.137 | 131.137 |
0156 - Combate à Violência Contra as Mulheres | 10.135.098 | 6.790.824 | 3.344.274 | 2.976.746 | 1.752.833 | 572.882 |
Total | 18.474.179 | 12.638.251 | 5.835.928 | 5.245.983 | 2.785.024 | 1.605.072 |
Fonte: Sítio SPM e SIGA BRASIL - Universo SIAFI - atualização até 30/07/2005.
Os dados disponíveis até julho demonstram que a SPM já se comprometeu a gastar quase todo o limite de despesas autorizado até agosto (90%), atingindo R$ 5,2 milhões. Mas, se considerarmos este nível de despesas já comprometidas (empenhadas), em relação ao estabelecido na Lei Orçamentária de 2005, esse percentual cai para apenas 28,4%. Passados 7 meses do ano esse percentual está muito abaixo da expectativa gerada pela Lei Orçamentária aprovada no Congresso Nacional. Já foram gastos quase R$ 2,8 milhões, sendo quitados até julho apenas R$ 1,6 milhões.
Contingenciamentos até Agosto e Lei Orçamentária 2005
Ação (Cod/Desc) | % Contingenciado / Valor Previsto na Lei Orçamentária | % Limite Autorizado Até Ago / Valor Previsto na Lei Orçamentária | % Empenhado / Limite Autorizado Até Ago/2005 | % Empenhado / Valor Previsto na Lei Orçamentária |
1068 - Gestão de Política de Gênero | 65,7 | 34,3 | 90,4 | 31,0 |
1087 - Igualdade de Gênero nas Relações de Trabalho | 77,2 | 22,8 | 92,6 | 21,1 |
0156 - Combate à Violência Contra as Mulheres | 67,0 | 33,0 | 89,0 | 29,4 |
Total | 68,4 | 31,6 | 89,9 | 28,4 |
A ampliação do limite das despesas que o Poder Executivo se dispõe a realizar até dezembro, caso permaneça nos moldes previstos pela Portaria 114/PR, não conseguirá recompor as dotações "cortadas", de forma minimamente satisfatória, haja visto que o limite da SPM para empenho até dezembro é de apenas R$ 8.020 mil para custeio e R$ 3.250 mil para investimentos3. Até setembro, um novo decreto deve ser editado, considerando a realidade fiscal e a disposição do Governo em manter ou ampliar o rigor fiscal ou possibilitar que as políticas sociais possam chegar à população.
Assim, a oportunidade de rever tal quadro de inanição das políticas sociais "contingenciáveis" é este. É fundamental que se promovam ações políticas dirigidas tanto aos ministros da área econômica num primeiro momento no sentido de contemplar a ampla gama de programas que devem se encontrar na mesma situação, quanto a Presidência da República no sentido de reverter esse quadro.
Esse é o motivo pelo qual o CFEMEA faz um alerta às conselheiras do Conselho Nacional dos Direitos da Mulher (CNDM), à Bancada Feminina e ao movimento de mulheres com vistas à ação política.
(1) Leia mais sobre a proposta de déficit nominal zero no site do INESC (www.inesc.org.br).
(2) Nota Técnica Conjunta no 04/2005 Contingenciamento do Orçamento de 2005. Aspectos Legais e Programáticos. Decreto no 5.379/05 e Portaria no 51/05. Consultoria de Orçamento e Fiscalização Financeira da Câmara dos Deputados. Consultoria de Orçamento, Fiscalização e Controle do Senado Federal.
(3) Portaria no 111, de 16 de março de 2005.