As penas brandas e a insuficiente rede de atendimento às mulheres vítimas de violência marcou o início de 2006 como um dos anos mais violentos para as pernambucanas. Até 20 de fevereiro, pelo menos 59 mulheres foram assassinadas no estado - mais de um assassinato por dia. Por isso, o Fórum de Mulheres de Pernambuco, após esgotar todas as tentativas de diálogo com o governo estadual, iniciou em janeiro uma ação mensal para denunciar a falta de políticas contra a violência de gênero no estado: a Vigília pelo Fim da Violência contra a Mulher. O ato tem como objetivo dar visibilidade à falta de políticas de segurança, prevenção e combate à violência contra as mulheres e mobilizar a sociedade pernambucana em torno do tema.

A partir de março, além da vigília no Recife, estão programadas vigílias em outros 17 estados e nas cidades do interior de Pernambuco, criando uma mobilização estadual permanente com palavras de ordem que estimulem a denúncia por parte das mulheres em situação de violência, ampliem na sociedade a indignação frente à violência sexista e pressionem o Estado a efetivar políticas de prevenção e enfrentamento da violência.

Pernambuco é um dos estados mais violentos do país, com as mais altas taxas de homicídio do mundo e um quadro crescente de atentados contra as mulheres. Quase todas as mulheres assassinadas neste início de ano foram vítimas de agressões praticadas por parceiros atuais ou por ex-companheiros, no ambiente familiar, doméstico ou mesmo nas ruas. Mas sabemos que, crescentemente, as mulheres também têm sido assassinadas por agressores desconhecidos, o que as deixam duplamente vulneráveis.

Segundo informações coletadas pelo projeto Observatório da Violência contra a Mulher, desenvolvido pelo SOS Corpo, de 2002 a 2005, 1.193 mulheres foram assassinadas em Pernambuco. Nos dados, Recife é apontado como o município com maior número de casos. Os crimes, porém, concentram-se em 10 bairros, onde ocorreram 56% desses homicídios. São eles: Ibura, Nova Descoberta, Iputinga, Imbiribeira, Dois Unidos, Casa Amarela, Santo Amaro, Piedade, Boa Viagem e Afogados.

Um dos fatores que agrava a situação é a falta de um aparato legal que garanta a segurança da vítima e a punição do agressor. Dos 185 municípios pernambucanos, apenas quatro possuem Delegacias Especializadas de Atendimento à Mulher, somente quatro têm casas-abrigo e dois dispõem de centros de referências municipais (que atendem no Recife e em Olinda).

Os números alarmantes da violência no estado têm chamado atenção de todo o Brasil. No dia 7 de fevereiro, a ministra da Secretaria Especial de Políticas para as Mulheres, Nilcéa Freire, esteve no Recife para propor a criação de um Fórum Estadual pela Segurança da Mulher, cujo início das atividades seria imediato. A proposta foi acatada pelo governo do estado, mas a convocatória para a primeira reunião só foi anunciada uma semana depois, durante a ida da Comissão Externa, liderada pela deputada Luiza Erundina (PSB-SP), para averiguar in loco os casos de violência sexista ocorridos no início do ano. O primeiro encontro dos membros do Fórum está previsto para 14 de março, mais de um mês após o primeiro anúncio.

Em carta aberta, o Fórum de Mulheres de Pernambuco pontuou algumas medidas necessárias para o enfrentamento da violência contra a mulher. São elas: 1) o Estado brasileiro precisa assegurar medidas que garantam a prevenção e o enfrentamento da violência, bem como a proteção das mulheres em situação de violência; 2) os governos municipais, estadual e federal precisam se posicionar imediatamente informando que medidas pretendem tomar para por fim a essa barbárie que atinge as mulheres em Pernambuco; 3) é fundamental a abertura imediata de inquéritos policiais para apuração dos crimes ainda não investigados; 4) exigimos que a formulação de políticas de prevenção e enfrentamento da violência contra as mulheres considere a situação de pobreza e a precariedade do trabalho ou o desemprego que atinge a população feminina; e, finalmente, 5) as políticas de segurança pública precisam estar conectadas a outras políticas, dentro de uma ação intersetorial com as demais Secretarias ou áreas de governo (saúde, educação, cultura etc).

Só com um aparato legal eficiente, as mulheres terão alguma chance de denunciar a situação de violência em que vivem. Só dessa forma, poderão enfrentar e não se calar dentro de um contexto mais amplo de desigualdade, comum a todas as mulheres: onde somos vistas com discriminação e preconceito, como pessoas de segunda categoria "que dão motivo para serem vítimas de agressões praticadas por companheiros, ex-companheiros, pais, irmãos, vizinhos".


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