Fátima Oliveira
Médica Coordenadora da Regional MG da Rede Saúde e Conselheira do Conselho Nacional dos Direitos da Mulher

O reconhecimento por parte da ONU do dia 25 (Dia Internacional pela Eliminação da Violência contra a Mulher) significa que o assunto tornou-se oficialmente, um tema digno de relevância e de ação internacional. Um assunto de interesse público e que os governos que integram a ONU, mais de 180 países, precisam assumir mais e mais a responsabilidade que lhes cabe na atenção à violência que se abate sobre as mulheres na vida privada e pública.

O Movimento Feminista, em todo o mundo, desde a década de 1970 tem se posicionado contra a violência de gênero e buscado dar visibilidade ao problema através de denúncias e de projetos pilotos de atenção às mulheres em situação de violência. No Brasil, nos anos 70, criamos o SOS Mulher e os grupos de auto-ajuda. Realizamos memoráveis eventos públicos e acompanhamos julgamentos de assassinos de mulheres exigindo punição sob o lema "o silêncio e a impunidade são cúmplices da violência".

Dentre as conquistas que mudaram o cotidiano de parte das mulheres, destaca-se o reconhecimento pela ONU da violência contra a mulher como um tema legítimo de direitos humanos nos anos 90. No Brasil presenciamos o aumento do debate sobre o assunto e a formulação de políticas públicas na área da segurança: criação de Delegacias de Mulheres (uma invenção brasileira que vários países adotaram) e casas-abrigo para mulheres em "risco de vida", e também nos anos 90 aumentou a compreensão de que a violência contra a mulher é também uma questão de saúde pública relevante.

No Brasil até agora contamos somente com 255 "Delegacias da Mulher". Apenas 90 casas-abrigo. Alguns estados possuem Serviços de Atenção à Mulher Vítima de Violência Sexual (não chegam a uma dezena) e apenas 17 hospitais realizam Aborto Previsto em Lei. Lembrando que temos 5.507 municípios e o acesso às DMs ainda é um privilégio de pouquíssimas mulheres. A maioria das Delegacias está sucateada e crescem as denúncias da desatenção, falta de privacidade, por ocasião da queixa e até maus tratos.

Cabe ressaltar que o entendimento de que a violência de gênero é também um problema de saúde pública é um "grande salto" teórico e político, além do que levou a OMS (Organização Mundial de Saúde) a reconhecer que a violência contra a mulher afeta a integridade física e a saúde mental. Agora os governos precisam adequar os serviços de saúde para acolhimento e atenção à mulher em situação de violência.

Mas é fato também que há dificuldades e resistência entre profissionais de saúde, no mundo, no entendimento da violência de gênero como um tema pertinente à saúde pública. Tornar realidade a atenção às mulheres violentadas nos serviços de saúde exige ainda uma grande luta, que é conscientizar instituições e profissionais de saúde do papel que lhes cabe desempenhar em um contexto de integração com uma rede de serviços que inclua polícia, judiciário e demais serviços de apoio. Mulheres à luta.


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