REVISTA AZMINA - Disseminar as informações corretas sobre o procedimento é fundamental na luta contra a descriminalização e a garantia do direito das meninas e mulheres 

 

 

AZMINA REVISTA

Natália Sousa
28 de setembro de 2022 - Revista Azmina

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Se você nasceu com um útero, provavelmente, em algum momento da sua vida, foi assombrada com alguma história que associava aborto à lesões muito sérias no corpo, infertilidade, problemas em gestações futuras e até morte. A sociedade, no geral, sempre alimentou vários mitos sobre aborto. E muitas dessas mentiras, sem embasamento científico, impedem as mulheres de obterem informações de qualidade e acesso à saúde para decidirem sobre seus corpos com segurança. 

 
Na verdade, as complicações de um aborto, de modo geral, acontecem nos casos em que a mulher não tem assistência médica, passa por procedimentos defasados ou é empurrada a métodos inseguros, por conta de uma legislação restrita, como a do nosso País, e do enorme preconceito. No Brasil, só é permitido interromper uma gravidez em casos de estupro, anencefalia e risco de vida à mulher. Não querer a maternidade não é motivo suficiente. 
 
 
Para que mulheres e meninas não se exponham a tantos riscos, a informação correta é imprescindível. Por isso, AzMina perguntou a algumas mulheres quais os principais mitos que já ouviram sobre o aborto e chamou a ginecologista, obstetra e ativista de direitos sexuais e reprodutivos Brunely Galvão para entender a verdade sobre o assunto. 
 
 
1) Usar pílulas abortivas tem enorme risco de hemorragia.
 
Cytotec é um dos nomes comerciais de um medicamento que se chama Misoprostol. Ele é essencial na obstetrícia, porque ajuda na indução do parto e no controle do sangramento no pós-parto. Em doses específicas, ele também pode ter um efeito abortivo e, por isso, no Brasil seu uso fora dos hospitais é proibido. O risco de hemorragia, em casos de interrupção da gravidez com o remédio, é extremamente baixo, de 0 a 3 a cada mil mulheres, e normalmente acontece quando a indução é feita de forma incorreta ou sem assistência adequada. Ou quando a mulher tem outros fatores de risco, como: idade gestacional mais avançada e sangramento em gestações anteriores. 
 
2) Misoprostol faz com que filhos nasçam com má formação em gestações futuras 
 
O Misoprostol não causa má formação em gestações futuras. Em gestações que estão em curso, se usado corretamente ele levará à interrupção da gravidez. E caso ela não se complete e a mulher não tente interromper de outra maneira, ele está associado a menos de 1% de chance de má formação.
 
3) O remédio explode o útero
 
O Misoprostol, não explode o útero, pelo contrário. No caso do aborto, o que ele provoca são contrações uterinas, que vão causar a expulsão do embrião ou do feto. 
 
4) A mulher fica infértil depois do uso do misoprostol 
 
Não existe qualquer relação entre infertilidade e aborto. O que pode acontecer, é a formação de sinéquias – uma espécie de cicatriz – e aí é preciso de uma intervenção, antes que a mulher consiga engravidar. Ainda assim, isso é mais comum em casos de aborto por meios cirúrgicos, principalmente na curetagem uterina, procedimento  defasado, mas ainda amplamente usado no Brasil. Em métodos medicamentosos não existe esse risco. 
 
5) Usar misoprostol aumenta o risco de trombose 
 
O Misoprostol não está associado ao risco de trombose. Ele não vai causar nenhum dano ao corpo da mulher. O que ele pode provocar são efeitos colaterais transitórios, como náusea, sensação de febre, sangramento e as cólicas que, nesse caso, são esperadas por um período de 24 até 48 horas. 
 
6) Misoprostol aumenta a chance de parto prematuro no futuro
 
O aborto não interfere em trabalhos de parto futuros. O principal fator de risco para parto prematuro é já ter tido um antes e outras condições como: excesso de líquido amniótico, gestação gemelar e uso de substância psicoativas. 
 
7) Aborto provocado aumenta o risco de câncer de mama
 
Interromper a gestação não aumenta o risco de câncer de mama. O aparecimento da doença tem a ver com estilo de vida, predisposição genética, histórico familiar, acesso a alimentos ruins e com agrotóxicos, abuso de álcool e outras drogas. 
 
8) A maior parte das mulheres que faz aborto vai sofrer com problemas mentais no futuro 
 
A maioria das mulheres que passa pela interrupção da gravidez tem a sensação de alívio e, mesmo anos depois do procedimento, elas chegam a dizer que foi a melhor decisão que tomaram, conforme as pesquisas. O que aumenta a chance de essa mulher ter problemas psicológicos é o tabu que envolve o aborto e as proibições em torno dele – sejam legais, morais, sociais ou religiosas. Não ter a oportunidade de decidir sobre o aborto acarreta mais problemas para essa mulher e para a criança, que nasce de uma gestação indesejada, do que imterromper uma gestação. 
 
9) O útero pode ser perfurado no aborto cirúrgico
 
Os métodos recomendados para aborto o cirúrgico são a Aspiração Manual Intrauterina, Aspiração Elétrica e Dilatação e Evacuação – os dois últimos não são muito conhecidos nem disponíveis no nosso país. Na Aspiração Manual Intrauterina, que é usada por aqui, o risco de perfuração é extremamente raro, acontece em 4 a cada cem mil mulheres.  Durante o procedimento, a paciente é sedada e só acorda quando a técnica já acabou – o que faz com que muitas escolham esse procedimento, quando isso é possível. Os riscos de perfuração uterina existem apenas no procedimento cirúrgico chamado curetagem – onde se utiliza uma cureta cortante para raspar os resíduos no útero. 
 
 
Vale lembrar que AzMina já contou nessa reportagem que em vários países vizinhos ao Brasil, como Colômbia e México, o aborto seguro em casa já é uma possibilidade. A mulher recebe os medicamentos e as orientações médicas para fazer a interrupção e conta com leis que a amparam nesse momento. Aqui, ainda se fazem necessárias luta e resistência para desmentir os mitos sobre aborto, manter direitos conquistados e reivindicar muitos que faltam.
 
 
NATÁLIA SOUSA
 
Roteirista
São Paulo SP -
 

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