'É inequívoca a urgência e a gravidade do caso', escreveu o Corregedor Nacional de Justiça, Luis Felipe Salomão.
Por Andréia Sadi, Paula Paiva Paulo
Pena aplicada pelo Conselho Nacional de Justiça proibia a promoção por merecimento por um ano. — Foto: Divulgação/CNJ
O Conselho Nacional de Justiça (CNJ) determinou que uma juíza e uma desembargadora do Tribunal de Justiça de Goiás prestem informações em até cinco dias sobre o caso de uma adolescente de 13 anos, grávida após um estupro, que foi impedida de realizar um aborto legal.
"É inequívoca a urgência e a gravidade do caso, em tese, razão pela qual determino a intimação da juíza Maria do Socorro de Sousa Afonso e Silva, titular do 1º Juizado da Infância e da Juventude de Goiânia, e a Desembargadora Doraci Lamar Rosa da Silva Andrade, do Tribunal de Justiça de Goiás, para que, no prazo de 05 (cinco) dias, prestem as informações que entenderem pertinentes", escreveu o Corregedor Nacional de Justiça, Luis Felipe Salomão.
O caso foi revelado pelo Intercept. A vítima foi estuprada por um amigo do pai. Na 18ª semana de gestação, tentou interromper a gravidez de maneira legal - já que é um caso previsto em lei.
O aborto legal é um procedimento de interrupção de gestação autorizado pela legislação brasileira e que deve ser oferecido gratuitamente pelo Sistema Único de Saúde (SUS). É permitido nos casos em que a gravidez é decorrente de estupro, quando há risco à vida da gestante ou quando há um diagnóstico de anencefalia do feto.
Segundo o portal Intercept, o próprio pai da vítima pediu na Justiça que a interrupção fosse adiada para que o feto tivesse chance de sobreviver. O genitor é apoiado por um grupo antiaborto e por religiosos.
A decisão do TJ de Goiás vem à tona dias depois de uma grande mobilização contra o avanço de um Projeto de Lei que equipara o aborto após 22 semanas ao crime de homicídio, inclusive em casos de estupro. Após a repercussão nacional, o projeto perdeu a força.
Abortos legais negados em São Paulo
No mês passado, uma mulher vítima de violência sexual conta que teve o aborto negado em quatro hospitais da cidade de São Paulo e que, na última tentativa, foi questionado pelo médico que ela gostaria de saber o sexo do bebê durante um exame de ultrassonografia.
“Ele (médico) me perguntou se eu queria saber o sexo do neném. Mesmo ele sabendo que era de uma que era de violência sexual, ele falou: mas você não quer saber?' Assim você já vê um nome, caso você não consiga (fazer o aborto). E eu falei: 'não, não quero saber.' E mesmo assim, ele falou. Foi muito difícil", conta.
Também em São Paulo, outra vítima de estupro teve o aborto legal negado por dois hospitais. A primeira negativa foi no dia 14 de junho, no Hospital da Mulher, unidade estadual de referência no atendimento de vítimas de violência sexual. A segunda recusa foi no dia 24, no Hospital Municipal do Campo Limpo.
No dia 27 de junho, a Justiça de São Paulo determinou que a Prefeitura indicasse em caráter de urgência um local para a realização do procedimento.
Ato pela defesa de pessoas vítimas de violência sexual acontece em frente ao Juizado da Infância e Juventude de Goiânia
Gustavo Soares- Jornal Opção
12 julho 2024 às 15h55
Foto: Guilherme Alves/Jornal Opção
Aconteceu nesta sexta-feira,12, ao meio-dia, em frente ao Juizado da Infância e Juventude de Goiânia, um ato de manifestação pela proteção da vida de crianças e pessoas vítimas de violência sexual. A manifestação foi organizada principalmente pela organização da sociedade civil Associação Mulheres na Comunicação e pelo coletivo de ativismo Bloco Não é Não.
O ato foi realizado em reação ao caso da menina de 13 anos, estuprada por um homem de 24 anos, que teve pedido de aborto legal negado pelo Tribunal de Justiça do Estado de Goiás (TJGO). O pai da criança de 13 anos é contra a realização do aborto legal e seguro, garantido no Brasil por lei em casos quando a gravidez é fruto de estupro, quando há risco de vida da gestante ou quando existe diagnóstico de anencefalia do feto.
A situação de Júlia, a menina de 13 anos, envolve duas dessas considerações e mesmo assim a Justiça determinou a realização de uma cesária adiantada. No entanto, a equipe médica do ambulatório de atendimento às vítimas de violência sexual do Hospital Estadual de Mulher de Goiânia em avaliação já considerou que a gestação de Júlia é de risco e que pode comprometer a vida da criança e do feto.
A manifestação que também repudia o Projeto de Lei 1904/24, conhecido como PL do Aborto, que promove uma pena maior para mulher do que ao em caso de aborto do que ao estuprador. O protesto contou com uma performance com roupas inspiradas na série de TV “O Conto da Aia”, que se trata de uma ditadura religiosa distópica na qual as mulheres não têm direitos sobre o próprio corpo. A narrativa retrata um período estadunidense infértil e frente a isso os corpos de mulheres que podem gerar são violados em prol de uma reprodução forçada pelo estado.
O que se pode constatar é que existe um mecanismo de impedimento para que essas pessoas que precisam acessar esse serviço consigam de fato ter a efetivação o que está descrito na lei […] Nós estamos aqui hoje lutar pelo direito que está assegurado constitucionalmente pra que essas mulheres, meninas e pessoas que gestam possam acessar o serviço de interrupção e realizar o aborto seguro e legal.
Bruna Porto, Associação Mulheres na Comunicação
O ato também teve cartazes, faixas, carro de som além da performance artística. No local havia três viaturas e cerca de 15 policiais militares. A atividade reuniu diversas entidades, entre elas Articulação de Mulheres Brasileiras – Goiás, Basuras Coletiva, Valenta Brasil, Associação Brasileira de Juristas pela Democracia, A Casa de Vidro, Goianas nas Urnas, Centro Popular da Mulher, Mães pela Paz, Grupo de Mulheres Negras Malunga.
O caso de Júlia não é isolado. A cada violência institucional, a cada revitimização de crianças e adolescentes iremos cobrar do estado. O sofrimento que essas pessoas meninas passam é inominável. De acordo com a Organização Mundial da Saúde alguns casos de estupro são comparáveis a traumas de guerra. Ter que viver esse calvário dentro de um sistema que deveria proteger é inaceitável. Não a isso! O estado é laico. O poder do Estado deve estar em primazia defendendo os direitos das crianças e dos adolescentes.
Cida Alves, Bloco Não é Não
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