O Governo conseguiu aprovar a Reforma Tributária na Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) da Câmara dos Deputados. Na votação, foram apresentados oito destaques ao parecer do relator, deputado Osmar Serraglio (PMDB-PR). Entretanto, todos foram rejeitados. O texto foi encaminhado para a Comissão Especial da Reforma Tributária. A expectativa é de que a matéria seja analisada em plenário até o final de julho ou começo de agosto. Fátima Gondim, vice-presidente do Unafisco (Sindicato Nacional dos Auditores Fiscais da Receita Federal), fala sobre o impacto desta Reforma na vida de cada brasileir@.

CFEMEA - Qual é a sua avaliação sobre as propostas do Governo para a Reforma Tributária?

Fátima Gondim - A prioridade para a Reforma Tributária tem uma fundamentação racional e filosófica pelo fato de que o sistema tributário é o lastro fundamental do Tesouro Nacional. A nossa matriz de arrecadação reflete um Estado de caráter profundamente desigual e excludente. O Governo estará persistindo no erro de destinar o ônus tributário exclusivamente para os assalariados e os consumidores médios, se tentar resolver a questão fiscal sem reorganizar o nosso modelo tributário.

O projeto para a Reforma Tributária tem pontos positivos e negativos. Mas, mesmo assim, ele não resolve o problema da elevada concentração da carga sobre os segmentos mais pobres da população. O Brasil é um país que necessita, antes de tudo, voltar-se para o desenvolvimento econômico e libertar-se das armadilhas financeiras que o impedem de crescer.

CFEMEA - De 1994 a 2002, a carga tributária brasileira cresceu seis pontos. Em oito anos, o PIB cresceu de 29,8% para 35,9%. Que setores arcaram com esse avanço da carga tributária?

Fátima Gondim - Esse crescimento recorde na história tributária brasileira se deu às custas do chamado "andar de baixo" da sociedade, ou seja, foram os assalariados e a classe média que pagaram a fatura. Isso ocorreu devido ao congelamento da tabela do Imposto de Renda das pessoas físicas, que abocanhou, de 1996 a 2002, 16 bilhões de reais dos trabalhadores que se transformaram em novos contribuintes. A conta desse segmento social também aumentou em função do constante reajuste das alíquotas de tributos indiretos e cumulativos como a CPMF e a Cofins. Essas contribuições atingem, sobretudo, quem tem menor poder aquisitivo, pois é a parcela da população que canaliza toda a sua renda para o consumo, sendo, portanto, atingidos em cheio pela tributação.

CFEMEA - Ao comprar uma lata de leite em pó, tanto a pessoa que ganha um salário mínimo por mês quanto quem recebe, no mesmo período, dez salários mínimos, pagam o mesmo valor de tributo. É possível afirmar que os tributos sobre o consumo contribuem para a continuidade da desigualdade sócio-econômica existente no Brasil?

Fátima Gondim - Sem dúvida. Uma tributação mais justa procura onerar mais quem possui uma renda maior. O Brasil já é campeão em concentração de renda. Então, o que justifica o fato de 70% do nosso bolo tributário ser produto de tributos regressivos, ou seja, aqueles que taxam o pobre e rico de forma igual? Essa opção de política tributária agrava a concentração de renda e alivia a situação daqueles setores com maior capacidade contributiva. Temos de mudar essa lógica. O Unafisco está lançando a campanha 'Imposto de Renda com Justiça é desonerar o trabalhador' com o propósito de incluir a questão da tributação isonômica na agenda da Reforma Tributária. Promover justiça tributária no País é corrigir sistematicamente a tabela do IR, é garantir a imunidade do mínimo existencial e é submeter tanto os rendimentos do trabalho como do capital à tabela progressiva.

CFEMEA - Nas famílias mais pobres há muitas mulheres chefes de família. Como fica a situação das mulheres neste cenário?

Fátima Gondim - A situação das mulheres torna-se mais agravada com a elevada tributação sobre os segmentos mais pobres. As estatísticas apontam o crescimento do número das mulheres que arcam com a responsabilidade financeira do lar. Isso significa que o aumento da tributação sobre o consumo atingiu diretamente as mulheres, pois as chefes de numerosas famílias, muitas vezes com seus companheiros desempregados, sofrem a redução de suas rendas devido ao fato de que 30% do preço dos artigos e serviços de primeira necessidade correspondem aos tributos indiretos.


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