Desde sua fundação, em 1988, a organização Cidade - Centro de Assessoria e Estudos Urbanos promove a capacitação técnica e alternativa em assuntos relacionados à problemática urbana. Dentre as principais ações, assessora as atividades relativas ao Orçamento Participativo (OP) de Porto Alegre - RS.
Nesta caminhada, um amplo aprendizado foi construído a partir das relações estabelecidas entre comunidades e representantes do governo municipal. A socióloga e assessora técnica Angela Gomes fala sobre os trabalhos da organização, especialmente em relação ao OP.
CFEMEA - Em que consiste o trabalho da ONG Cidade?
Angela - Nosso foco está nas populações sem acesso aos serviços públicos, tendo como meta o empoderamento desta população e a gestão democrática da cidade, por meio de mecanismos como o Orçamento Participativo (OP). Por acesso à cidade, entendemos não apenas o conjunto das infra-estruturas físicas urbanas (redes de água e esgoto, energia elétrica, transporte público, segurança etc.), mas também as infra-estruturas econômicas, sociais, culturais e políticas, por meio do acesso à cidadania plena.
Fazemos assessoria e pesquisa, articulando atividades de base, como seminários, workshops, cursos e desenvolvimento de projetos com atividades investigatórias, produzindo informação estratégica e democratizando o seu acesso.
CFEMEA - Como a ONG Cidade iniciou esta atuação?
Angela - Surgidos como ONG em pleno processo de redemocratização do país, nossa primeira ênfase foi apoiar as expectativas populares que se fortaleciam no final dos anos 80. Inicialmente, o trabalho se voltou para a assessoria a movimentos sociais urbanos.
A intervenção concreta na dinâmica dos movimentos sociais urbanos nos garantiu legitimidade para atuar junto à Câmara de Vereadores como interlocutor relevante na construção de propostas de interesse popular para a Lei Orgânica Municipal (1990).
A partir de 1990, além das áreas mais técnicas em que atuávamos (planejamento urbano, transporte público, habitação e regularização fundiária), incorporamos o tema do OP. Além disso, com a conquista de governos locais por partidos opositores ao regime militar, acentuou-se a linha de se construir e garantir os espaços democráticos e os instrumentos legais que viabilizassem o funcionamento desta nova institucionalidade democrática, via participação popular na gestão.
Em 1994, iniciamos um acompanhamento sistemático ao processo do Orçamento Participativo, no sentido de qualificar a atuação dos participantes através da promoção de seminários de formação, assim como a realização de pesquisas sobre o perfil do público participante.
No caso da pesquisa, identificamos uma crescente participação das mulheres não apenas nas plenárias regionais, mas também enquanto dirigentes de associações comunitárias e como delegadas do OP, onde já são mais de 50% dos participantes.
Mas, no Conselho, a participação das mulheres, embora tenha crescido, ainda se restringe a 30% dos conselheiros. Em nosso projeto atual, com apoio da Fundação Ford, realizamos entrevistas com mulheres conselheiras para resgatar a trajetória de suas atuações, bem como investigar o motivo desta situação. Organizamos, também, um grupo de discussão sobre diferentes temas, entre os quais o papel da mulher no OP, no sentido de provocar mais esta discussão.
CFEMEA - As atuações relacionadas ao Orçamento Participativo conside-ram as questões de gênero?
Angela - O tema das questões de gênero dentro do OP ficou por muito tempo pouco expressivo, sobretudo no espaço do Conselho do OP. A fala dos participantes é muito mais voltada à questão da comunidade, num tipo de discurso que não explicita as diferenças existentes na mesma.
Percebemos que, inicialmente, havia alguma resistência em abordar a questão de gênero com suas especificidades, inclusive para as próprias mulheres que se encontram na condição de representantes. A partir dos grupos de discussão que tivemos no IV Congresso da Cidade, um grupo de Conselheiras do OP passou a colocar em debate o papel da mulher dentro deste processo.
É claro que ainda temos muito que avançar nas discussões deste tema. No entanto, percebemos que neste último período houve avanços nos debates.
Ultimamente, procuramos afirmar a dimensão pluralista deste processo, por meio das discussões envolvendo gênero e etnia e, bem mais recentemente, a questão da renda.
A definição de políticas públicas incorporando as relações de gênero, a partir da visão das próprias mulheres, poderá contribuir para uma nova forma diferenciada de gestão do Estado.
Para outras informações, acesse o site www.ongcidade.org, ou ligue para (51) 3264-3386.