Patrícia Rangel
Assessora do CFEMEA

vida das mulheres é repleta de marcas de opressão que assumem diversas formas em diferentes esferas da sociedade: a gravidez compulsória e criminalização das práticas de aborto, a violência contra as mulheres, a desproteção social, as diferenças de salário entre os sexos, a negação de direitos para as mulheres lésbicas, o racismo que opera sobre as mulheres negras, deixando-as ao final da fila da cidadania.

Nos espaços institucionais da política, a opressão se manifesta na sub-representação feminina. Nem exclusividade do Brasil, nem dos dias atuais, a baixa presença das mulheres nas instituições democráticas é fruto de nossa cultura patriarcal, da dificuldade de acesso a recursos financeiros que mulheres e grupos minoritários enfrentam e de características de nosso sistema político-eleitoral: lista aberta, financiamento misto de campanhas eleitorais, descumprimento da cota de candidaturas femininas, enfraquecimento dos programas partidários, falta de ações afirmativas para mulheres no jogo eleitoral e na vida partidária.

Há muitos anos, os movimentos feministas vêm apontando a necessidade de uma reforma política profunda e democrática para incluir as mulheres e outros setores sociais que são politicamente minoritários (apesar de muitas vezes serem maioria na sociedade, como é o caso das mulheres, d@s negr@s e da população trabalhadora). Os pontos centrais estão sistematizados na Plataforma Feminista, no ponto de vista feminista sobre a Reforma Política e na Plataforma dos Movimentos Sociais pela Reforma do Sistema Político. Em suma, defendem um modelo inclusivo com relação às mulheres e outros segmentos historicamente excluídos, um sistema político-eleitoral democrático e laico, com fortalecimento dos partidos, financiamento público exclusivo das campanhas, combate ao personalismo, igualdade de condições nas disputas eleitorais e combate à corrupção nas campanhas e mandatos, paridade nos Parlamentos através da instituição de listas partidárias pré-ordenadas nas eleições proporcionais, com alternância de sexo (1 mulher / 1 homem).

Saibamos então que a atual legislatura acaba de aprovar uma reforma política - ou melhor, uma minirreforma eleitoral - que garante algumas ações, extremamente modestas, voltadas para a participação política das mulheres. A modéstia dessas ações pode ser entendida pela resistência da maioria de nossos parlamentares às propostas mais radicais de reforma política ampla, e deve ser encarada como uma conquista frente a esse contexto desfavorável para grandes transformações democráticas. A Lei 12.034, aprovada no Congresso e sancionada em setembro de 2009, foi fruto de negociações partidárias, atestando o enfraquecimento das instituições representativas. Entretanto, a interação do CFEMEA, Articulação de Mulheres Brasileiras (AMB) e

outras organizações dos movimentos de mulheres articuladas com a Bancada Feminina e a Comissão Tripartite de revisão da Lei Eleitoral (Lei 9.504 de 1997), resultou positivamente na aprovação das seguintes ações afirmativas na Lei 12.034:

  • obrigatoriedade dos partidos políticos em destinar 5% do Fundo Partidário à formação política das mulheres (punição em caso de violação desta regra); e em preencher a cota de 30% de vagas de candidaturas femininas;
  • reserva de 10% do tempo de propaganda partidária (fora de anos eleitorais) para promover e difundir a participação feminina.

Temos uma nova lei eleitoral. Será essa capaz de impactar positivamente a vida das mulheres, garantindo mais representação numérica e substantiva para a coletividade feminina em espaços institucionais da democracia representativa? Essa é uma resposta que só as próximas eleições podem trazer. Esperamos que sua completa aplicação contribua para elevar a representação feminina nesses espaços e a qualidade das políticas e dos debates públicos acerca da vida e dos direitos das mulheres brasileiras.


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