Deputado Federal Paulo Paim (PT-RS)

A emenda constitucional que o governo pretende enviar ao Congresso Nacional, retirando e jogando para a livre negociação 34 direitos sociais assegurados aos trabalhadores na Constituição Federal, é muito grave. Nos vem à mente o filme "Proposta Indecente" em que o protagonista faz uma proposta de um milhão de dólares para que a personagem vivida pela atriz Demi Moore passe uma noite com ele criando um conflito de interesses, inclusive, com o marido dela.

O governo recebeu essa proposta de empresários e a traz para os trabalhadores - muitos deles que o elegeram para ser o mandatário do país. Quanto ganha o governo com isso, não sabemos. Mas que a proposta é indecente, isso ela é. Talvez até mais indecente do que a criada no filme.

Vejamos o que quer o governo e os que estão acobertados por ele: os 34 artigos da Constituição só teriam validade se não houvesse nada em contrário na tal de livre negociação.

Com isso, o texto passaria a ter a seguinte redação: "Art.7º. São direitos dos trabalhadores urbanos e rurais, além de outros que visem a melhoria de sua condição social, ressalvada a negociação coletiva:..."

Com essa simples modificação, os direitos assegurados aos trabalhadoresem nível constitucional só seriam válidos se acordo, convenção ou contrato coletivo de trabalho não dispusesse de outra forma.

Em outras palavras, caso essa emenda venha a ser aprovada, direitos básicos como licença maternidade, aviso prévio, décimo terceiro salário, férias acrescidas de um terço, proteção contra despedida imotivada, repouso semanal remunerado, redução dos riscos inerentes ao trabalho, adicional de remuneração para atividades insalubres, perigosas ou penosas, proteção em face da automação, horas extras, atualmente assegurados pelo texto constitucional, poderão ser reduzidos ou extintos em contratos individuais de trabalho através da negociação coletiva.

Mas não é somente isso. Este mesmo governo anunciou que os trabalhadores das micro e pequenas empresas terão os mesmos direitos dos empregados domésticos. Em uma medida anunciada com badalação nacional o governo diz que é a favor da ampliação dos direitos dos empregados domésticos. Em outra, diz que quer diminuir os direitos de todos os trabalhadores, detonando o artigo sétimo da Constituição Federal.

Pela confusão armada, é difícil saber o que este governo de fato quer. Temos certeza, unicamente, que por conta dessas trapalhadas, os trabalhadores é que pagarão o pato, como já aconteceu na reforma Administrativa e da Previdência Social.

A confusão é tanta que até mesmo os empregados domésticos que estão incluídos no artigo sétimo passarão a ter direito, via livre negociação, a abrir mão de direitos mínimos assegurados na Constituição Federal.

Em resumo, uma medida provisória diz que você negocia acima da lei e uma emenda constitucional diz que você negocia abaixo da lei.

Isso significa que o princípio da irrenunciabilidade dos direitos trabalhistas, uma conquista tão cara aos trabalhadores brasileiros, cairia por terra na medida em que esses direitos deixariam de ser obrigação patronal para ser objeto de negociação. Haveria uma completa inversão de valores, um retrocesso inaceitável.

A livre negociação em plena recessão e arrocho salarial torna-se uma farsa. Essa emenda somente contribuirá para que os trabalhadores sejam forçados, em função do desemprego, a discutir propostas de acordos indecentes. O governo espelha-se na legislação dos EUA, só não diz que lá o salário mínimo vale em torno de 1000 dólares; aqui, 65 dólares. O desemprego lá é insignificante; aqui, chega a 20% nas capitais. Lá, uma baby sitter (babá de crianças) ganha 10 dólares por hora, ou seja, mais de um salário mínimo brasileiro por dia.


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