Jussara Reis Prá
Doutora em Ciência Política pela USP. Professora no PPG em Ciência Política da UFRGS. Conselheira do Conselho Nacional dos Direitos da Mulher/CNDM

Os períodos pré e pós-eleitorais no Brasil, em especial desde a década de 1990, têm suscitado o debate sobre a influência da instituição de cotas mínimas por sexo (Lei de Cotas) para o aumento do número de mulheres eleitas. Com a proximidade das eleições de 2002, mostra-se oportuno retomar essa discussão, tendo em vista a ainda limitada presença feminina no quadro político brasileiro.

A experiência recente das cotas no país, passadas duas eleições municipais (1996, 2000) e uma de âmbito estadual e nacional (1998), não permite criar séries temporais para avaliar se os resultados obtidos pelas mulheres tendem a ser permanentes e estruturados, apesar do registro das alterações produzidas nas urnas com a introdução das cotas e dos reflexos disso no panorama político nacional. De qualquer forma, embora as mulheres já tenham acumulado somas expressivas de votos e vencido disputas eleitorais acirradas, não se reduziu o deficit de representação feminina no Brasil.

Em países que adotam os sistemas legais de ação afirmativa (cotas) há mais tempo, o saldo do uso de cotas tem sido considerado bastante satisfatório em virtude da elevação dos percentuais de representação feminina. A evidência empírica, no entanto, tem demonstrado que as cotas por si só não garantem a inclusão das mulheres nas instâncias de poder e sugere existir uma relação estreita entre o aprofundamento da democracia e a superação de fatores que dificultam o seu ingresso em esferas de decisão política.

No caso brasileiro, a permanência de uma cultura política pautada por valores e condutas paternalistas, elitistas e autoritárias, tende a reforçar a exclusão das mulheres dos cenários públicos e das instâncias políticas. Nesse sentido, notadamente por meio de mecanismos legais (cotas) é possível estabelecer regras e preceitos democráticos para assegurar a igualdade de oportunidades no processo político-eletivo. Isso, porém, não garante o incremento de candidaturas e a eleição de mulheres. Também não garante que candidatas ou eleitas venham a representar os interesses das mulheres frente à sociedade.

O quadro aqui esboçado aponta para a necessidade de se pensar em açõesvoltadas a compatibilizar as cotas a outros mecanismos de empoderamento, que visem a democratização das relações políticas por meio da (re)distribuição de poder entre homens e mulheres. Isso significa dizer que, para além das cotas, é necessário desenvolver um conjunto de ações voltadas à politização das mulheres, a sua capacitação e sensibilização para as questões de gênero e para o seu ingresso efetivo no mundo político. Esse, portanto, seria um dos caminhos a seguir para permitir o preenchimento das cotas, e a eleição de um número cada vez maior de mulheres comprometidas com a sua identidade de gênero, com a busca de igualdade e equidade social, em suma, com um projeto ético-político que envolva homens e mulheres.


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