Quase lá: Novembro passou outra vez. E agora?

Edson Lopes Cardoso é editor do jornal Irohin. Ativista do Movimento Negro, é mestre em Comunicação Social pela Universidade de Brasília (UnB) e já editou o jornal Raça & Classe e o Jornal do MNU.

Mais um novembro se foi sem que nada se alterasse na situação de precariedade em que vive a população negra. A sucessão estonteante de eventos em todo o país não consegue ainda abrir caminho para possibilidades concretas de atendimento a uma pauta de reivindicações construída há décadas.

Nossas tímidas e temerosas inserções institucionais (secretarias, etc.), em diferentes níveis de governo, deixaram-se mais uma vez envolver pelo clima das exposições e mostras, seminários, shows, lançamentos e debates, frustrando as expectativas criadas em torno da formulação e implementação de políticas públicas.

Instâncias governamentais que querem ser levadas a sério não se dedicam a reproduzir eventos cuja efetividade, afinal, sempre foi uma incumbência muito bem realizada pelo movimento negro. Parece apenas uma forma de suprir a escassez de políticas.

Se há de fato algum poder, este poder deveria buscar articular condições que viabilizassem a implementação de políticas de combate ao racismo e de superação das desigualdades raciais. Isso parece óbvio.

Novembro mostrou que não se pode mais escamotear a debilidade que envolve o conjunto de nossas inserções institucionais. Debilidades que, é bom que se diga, raramente vêm à tona nos debates. Afinal, há algo que mereça ser rediscutido? Como escapar do maniqueísmo que se mostra incapaz de pensar além de oposições partidárias presumidamente antagônicas? Até quando ficaremos impedidos de discutir nossas debilidades, tolhidos pelo receio de ser acusados de contribuir com "a volta da direita ao poder"? Fala sério...

Para ficarmos em dois exemplos: quais são os impasses reais à tramitação do Estatuto da Igualdade Racial? O que impede a implementação da Política Nacional de Saúde da População Negra, engavetada há um ano?

Os negros no poder têm, afinal, que parcela de responsabilidade no vazio de negociação e debate que cerca propostas de interesse crucial para milhões de afro-brasileiros? Quem decide a vontade governamental sobre o encaminhamento dessas propostas de políticas públicas? Há uma mesa de negociação, onde se confrontam posições, como acontece com a CPMF e dezenas de outros temas da conjuntura? Há lugar na negociação para uma participação transparente do movimento negro?

Novembro foi bom, principalmente porque já não podemos esconder de mais ninguém a irresponsabilidade com que estamos tratando tarefas políticas complexas, urgentes e necessárias.

Este artigo foi publicado na página eletrônica www.irohin.org.br.


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