Estudo de Clara Wardi recebeu Prêmio UnB de Melhor Dissertação; confira entrevista com a pesquisadora.
Por meio dos acórdãos judiciais, Wardi buscou entender os papéis sociais dos envolvidos, como a mulher acusada, a família, o feto, o genitor, o vendedor de remédios e os profissionais da saúde.
Em um país em que até o aborto legal está sob risco, mulheres que decidem interromper gestações de forma clandestina sofrem com a insegurança do procedimento, que pode levar a complicações de saúde graves, e com a criminalização de sua escolha, que desemboca em diferentes formas de violência institucional. Esse foi o objeto de estudo da dissertação de mestrado de Clara Frota Wardi, vencedora do Prêmio UnB de Melhor Dissertação na área de Ciências Humanas em 2024.
Em "Inquisição reprodutiva: análises sobre o aborto clandestino no Sistema de Justiça Criminal (2012-2021)", a pesquisadora investigou microdados públicos produzidos pelas Secretarias de Segurança sobre o aborto clandestino no Brasil nos últimos dez anos. Por meio dos acórdãos judiciais, Wardi buscou entender os papéis sociais dos envolvidos, como a mulher acusada, a família, o feto, o genitor, o vendedor de remédios e os profissionais da saúde.
Em entrevista ao Brasil de Fato DF, a mestre em Sociologia explica como a atuação das polícias e do Judiciário em casos de mulheres que decidem interromper gestações clandestinamente assemelha-se a uma verdadeira “inquisição reprodutiva”. A pesquisa mostra que elas são julgadas pela sociedade e pelo sistema de justiça criminal a partir de fatores morais e discriminatórios.
As formas de perseguição de mulheres que buscam ter autonomia reprodutiva e compartilham saberes sobre o tema se atualizam com o passar do tempo, revitalizando a “caça às bruxas”. “Por não decidirem pela maternidade, [as mulheres que abortam] tornam-se bruxas deste tempo”, afirma Wardi.
“Mulheres que rompiam com expectativas sociais sobre a reprodução e a sexualidade foram associadas a seres essencialmente perigosos e ameaçadores, que é uma ideia que se propaga até hoje, mas sem essa associação tão direta à bruxaria”, destaca a pesquisadora.
A dissertação, orientada pela professora Tânia Mara Campos de Almeida, aborda um tema sensível, urgente e ainda pouco abordado no debate público. A pesquisa, que trata dos direitos reprodutivos de mulheres, foi premiada em um contexto político de articulação de forças conservadoras contra o aborto legal.
“Ter ganhado esse prêmio é um reconhecimento muito valioso de que os estudos sobre os direitos reprodutivos são legítimos dentro das ciências sociais e capazes de trazer contribuições para além do campo feminista”, aponta Wardi.
Confira, no link, a entrevista completa: https://www.brasildefatodf.com.br/2025/01/07/pesquisa-analisa-atuacao-da-justica-em-casos-de-aborto-clandestino-inquisicao-reprodutiva