Festival contou com 1ª edição do Prêmio da Jacira Silva, reconhecendo o trabalho de jornalistas e veículos afrocentrados
Brasil de Fato | Brasília (DF) | 30 de julho de 2024 às 15:34
1ª edição do Prêmio Jacira Silva - Amanda Gomes
"Vem Ser Fã de Mulheres Negras" foi o chamado da 17ª edição do Latinidades. Em Brasília, o encontro começou no Dia Internacional da Mulher Negra Latino-americana e Caribenha, celebrado em 25 de julho, e contou com três dias repletos de debates, música, moda, literatura e celebração da afrolatinidade.
A mesa de abertura do festival deste ano debateu o ofício do trançar enquanto patrimônio cultural, economia criativa e trabalho. Trancistas e pesquisadoras defendem que a prática seja considerada patrimônio imaterial do Brasil.
Layla Maryzandra, pesquisadora da Universidade de Brasília (UnB) e coordenadora do projeto “Tranças no Mapa”, destaca o caráter cultural e afetivo dos modos de saber e fazer das trancistas do Distrito Federal e Entorno.
“Essa prática de trançar vem exatamente desse lugar primeiro, desse afeto, desse cuidado, da gente estar especialmente entre mulheres negras trançando, conversando, trazendo várias perspectivas que estão ligadas aos nosso modos de vida”, disse durante a mesa.
Layla aprendeu o ofício da mãe e da bisavó, mas é a primeira da família a torná-lo fonte de renda e objeto de pesquisa.
O debate também contou com a participação do presidente do Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan), Leandro Grass, que explicou as etapas do processo de registro como patrimônio imaterial.
Segundo ele, o órgão já realizou conversas importantes com grupos e instituições que representam trancistas e, agora, o próximo passo é o levantamento de documentos e pesquisas que instruirão a patrimonialização do ponto de vista formal.
Grass também defende que o ofício do trançar é um patrimônio cultural. “Primeiro porque nós todos nos reconhecemos nesse saber. Segundo, porque ele tem capilaridade, ele não é localizado, ele se amplia e irradia para os territórios. E o mais importante de tudo: ele diz sobre quem nós somos”, afirmou durante o encontro.
Mulheres Negras na Mídia
A atuação e o impacto das mulheres negras na comunicação pública foi tema do segundo dia do Latinidades. Além de conversa sobre os desafios e conquistas do grupo na mídia, o festival realizou uma premiação inédita: o Prêmio Jacira da Silva.
A jornalista homenageada foi a primeira negra a assumir a presidência do Sindicato dos Jornalistas do Distrito Federal, entre 1995 e 1998. Jacira também fundou a Comissão de Jornalistas pela Igualdade Racial (Cojira/DF). Atualmente, é diretora de Condições de Trabalho e Qualidade de Vida do Sindicato.
Para Jacira, apesar de estarem em menor número nas redações brasileiras, a presença de mulheres negras traz uma nova perspectiva para o jornalismo.
“Hoje, fruto da luta do movimento negro organizado no Brasil, nós mulheres negras estamos na TV, no rádio, nas redes como nós somos. Do jeito que a gente quer se vestir, quer se pentear. Com a nossa autoestima e com a nossa história, dos nossos ancestrais, das nossas famílias. E sem ser exótico, e sim sermos quem nós somos, com o nosso cabelo crespo, o nosso cabelo para cima, solto, trançado com o nosso nariz chato e com a nossa pele negra. Mas a gente ainda continua sendo uma ou duas, contando nos dedos”, disse em entrevista à Agência Brasil.
Na categoria Jornalistas Negras, a gerente da Agência Brasil, Juliana Cézar Nunes, recebeu o prêmio ao lado de nomes como Maju Coutinho, da Rede Globo, e Basília Rodrigues, da CNN.
Na categoria Mídias Negras, foram premiadas a Revista Afirmativa, a agência de notícias Alma Preta, o Instituto Cultne, o Mundo Negro e o Africanize, veículos de comunicação que priorizam e dão visibilidade às pautas ligadas à população negra brasileira.
Pretas que escrevem no DF
Antes do encerramento do Latinidades, com uma noite de shows nacionais – com nomes como Alaíde Costa, Ebony e Gaby Amarantos – e internacionais, a tarde do sábado (27) foi palco do quarto encontro “Julho das Pretas que Escrevem no DF”.
O objetivo foi mapear e reunir mulheres negras que escrevem na capital federal, promovendo trocas e fortalecimento de laços. O encontro também é uma vitrine para dar visibilidade à produção dessas escritoras.
“A gente não quer ficar com os livros na gaveta”, disse a escritora e jornalista Waleska Barbosa, idealizadora do coletivo que organiza o evento. “Conceição Evaristo publicou um livro com mais de 20 anos na gaveta. Então, eu sempre digo que esse encontro de pretas que escrevem no DF é para a gente não passar tanto tempo sem publicar e sem falar”, enfatizou.
A programação contou com sarau, performances artísticas, exposição e venda de livros, além da tradicional homenagem a escritoras de diferentes gerações.
Conceição Freitas, amazonense que mora em Brasília há 40 anos, foi uma das homenageadas. Repórter “de tudo quanto há” e cronista, conquistou 12 prêmios de reportagem, dentre eles o Esso Nacional por uma série de histórias de amor entre excluídos e o Prêmio Abdias Nascimento pela série Negra Brasília.
As irmãs goianas Lourdes e Jovina Teodoro também receberam homenagens pelo trabalho realizado na literatura, com foco em narrativas negras. A carioca Elisa Mattos, a poeta e professora da UnB Norma Hamilton e Ailin Talibah completaram o time das homenageadas.
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Edição: Márcia Silva