Levantamento apontou que meninos vão 18 vezes menos ao urologista do que meninas ao ginecologista
A falta de conhecimento dos homens sobre sua saúde sexual não é uma novidade e, muitas vezes, as mulheres também são prejudicadas por essa ignorância. Quando se fala em check-up anual em ginecologistas e urologistas, as mulheres saem em disparada na frente dos homens. Levantamento inédito realizado pela Sociedade Brasileira de Urologia (SBU), com dados do Sistema de Informação Ambulatorial do Ministério da Saúde (MS), apontou que o número de atendimentos de adolescentes meninos de 12 a 18 anos ao urologista é 18 vezes menor que o de atendimentos de meninas da mesma faixa etária ao ginecologista.
Uma estudante de 20 anos, que preferiu não se identificar, conhece bem a gravidade desse problema. “Eu acabei contraindo herpes em julho deste ano numa relação estável e fixa com meu parceiro. Ele tinha herpes, mas não sentia dor, era quase assintomático”, relata. Ela diz que seu parceiro nunca havia feito exames de rotina e apresentava apenas alguns episódios de coceira no órgão genital, mas que passavam em cerca de três dias. “No meu caso, eu sentia muita dor e tive muitos sintomas”, detalha a estudante.
De acordo com o professor Aguinaldo Nardi, do curso de Medicina da Faculdade de Odontologia de Bauru (FOB) da USP e ex-presidente da SBU, o grande empecilho das consultas médicas para os homens é o preconceito ou também o sentimento de invencibilidade, de que nada vai lhe ocorrer. “Em relação à saúde sexual do homem, o tabu é ainda maior. O homem demora praticamente um ano no mínimo para procurar um médico para lhe ajudar na questão sexual”, informa o especialista.
O recomendado é que as consultas médicas para realizar um check-up de rotina sejam feitas anualmente ou quando houver alguma demanda, tanto para homens quanto para mulheres. “Considerando a idade para o início, dentro da política do programa #VemProUro do Departamento de Urologia do Adolescente da SBU, o ideal é que aconteça a partir do início da puberdade, que, no geral, pode-se dizer após os 10 anos de idade”, afirma o professor associado da Divisão de Urologia do Departamento de Cirurgia e Anatomia, Carlos Augusto Fernandes Molina, da Faculdade de Medicina de Ribeirão Preto (FMRP) da USP.
Responsabilidade na relação
Algumas infecções sexualmente transmissíveis (ISTs) não necessariamente vão apresentar sintomas diretamente ligados ao homem, como ocorreu no caso relatado pela estudante. Nesse sentido, a falta de conhecimento que os homens têm da própria saúde sexual pode acarretar uma responsabilidade indireta sobre as mulheres na hora de identificar algum problema que ela venha a sofrer.
Ainda segundo Molina, o papilomavírus humano (HPV) deve receber mais atenção, pois se apresenta frequentemente na forma de verruga, a qual pode acontecer em outras regiões do corpo, tratado usualmente como problema estético. “No entanto, na mulher, o HPV genital está intimamente relacionado ao câncer de colo uterino, sendo a grande causa da ocorrência dessa doença em mulheres adultas jovens”, explica.
Considerando que a vacina para o HPV existe há alguns anos, disponível na rede pública de saúde a partir da idade de 11 anos para o sexo masculino e 9 anos para o sexo feminino, o professor destaca a falta de conhecimento sobre a saúde sexual. “Esse programa de vacinação, que se iniciou em 2014 para as meninas e em 2017 para os meninos, permanece ainda desconhecido por muitos. Possivelmente, esse desconhecimento esteja associado ao fato de, após a adolescência, a visita rotineira ao médico deixar de acontecer”, pontua.
Problemas para a vida
Muito além das IST’s, diversos problemas estão relacionados à saúde sexual masculina, como a disfunção erétil e a ejaculação precoce. Esses dois fatores estão ligados a uma qualidade de vida ruim, como apresenta Nardi. “A disfunção erétil é um fator preditivo para o infarto agudo do miocárdio, já que a artéria peniana é um terço do calibre da artéria coronária. Portanto, ela pode predizer um infarto agudo do miocárdio”, descreve o especialista.
Somado a isso, segundo o professor, pacientes que têm dislipidemia severa, ou seja, o aumento dos níveis de colesterol e triglicérides, podem apresentar mais frequentemente disfunção erétil. “Os diabéticos podem sofrer com a disfunção erétil de uma maneira muito maior do que os homens que têm suas taxas de glicemia normais. Entretanto, isso não é difundido no meio social do homem, o que acaba dificultando muito o tratamento”, alerta.
Nesse sentido, alguma IST não identificada, ou não tratada corretamente, e até um problema de disfunção erétil podem afetar muito a relação interpessoal de um casal. “Quando o homem deixa de cuidar da sua saúde, ele está afetando indiretamente a sua companheira, a sua família, e isso deve ser muito divulgado, porque, dessa maneira, é capaz de mudarmos um pouquinho esses números alarmantes que têm no Brasil sobre a saúde do homem”, finaliza Nardi.
*Estagiária sob supervisão de Ferraz Junior