Grupo irá atuar em prol da agenda dos povos tradicionais; combate a PLs como o do marco temporal também estão no radar
Foi instalada nesta terça-feira (7), na Câmara dos Deputados, a Frente Parlamentar Mista em Defesa dos Povos Indígenas, grupo que reúne 203 deputados e senadores interessados em defender as pautas de interesse dos povos originários no Congresso Nacional. Com a mudança de governo e a ascensão de personagens indígenas ao Poder Executivo, o lançamento se deu em meio ao clima de fortalecimento do movimento político pró-povos tradicionais.
Na dinâmica do Poder Legislativo, frentes parlamentares são grupos de perfil suprapartidário que se formam com o objetivo de promover alguma pauta específica, muitas vezes de maneira articulada com a sociedade civil organizada e com outros atores interessados na mesma agenda. Dessa forma, podem adquirir maior ou menor importância conforme as ações que promovem e o espaço político que cavam em meio ao jogo de forças do parlamento.
No caso da frente lançada nesta terça, o grupo deverá atuar em parceria com entidades civis e o Ministério dos Povos Indígenas (MPI).
No Senado, a frente será coordenada pelo senador Randolfe Rodrigues (Rede-AP), enquanto, na Câmara, a liderança ficará a cargo da deputada Célia Xakriabá (PSOL-MG), para quem o grupo deverá “fazer um debate técnico e político” sobre pautas que afetam os indígenas. Ela mencionou, por exemplo, a preocupação com o Projeto de Lei (PL) 490/2007, que legaliza a tese do marco temporal, segundo a qual os povos originários só podem reivindicar demarcações de áreas já ocupadas por eles desde antes da promulgação da Constituição Federal de 1988.
De interesse da bancada ruralista, a pauta é uma das mais combatidas pelas lideranças dos povos tradicionais e voltou à tona recentemente, a partir de uma articulação de parlamentares interessados em agilizar a tramitação da matéria na Câmara. Interlocutores da Frente Parlamentar Mista em Defesa dos Povos Indígenas e aliados têm dito que o combate ao PL 490 seguirá no radar do segmento, bem como outras medidas e contextos de crise que atingem as comunidades tradicionais.
“O Brasil é terra indígena, mas este parlamento também é. O que está acontecendo na Bahia, o que está acontecendo com o povo Yanomami [em Roraima] não se trata somente de pauta progressista. Trata-se de pauta humanitária”, disse Xakriabá durante o lançamento da frente. A Articulação dos Povos Indígenas do Brasil (Apib) também esteve no evento para apoiar o trabalho do grupo.
“Este momento faz parte de um novo processo deste cenário de retomada da política indigenista e comandada pelos povos indígenas e o movimento indígena brasileiro”, disse Kleber Karipuna, da coordenação-executiva da entidade, ao mencionar ainda o que chamou de “retomada da Funai [Fundação Nacional dos Povos Indígenas] e da Sesai [Secretaria Especial de Saúde Indígena]”, órgãos que agora estão sob a condução de lideranças indígenas.
Para parlamentares que se alinham à agenda indígena, a instalação da frente é também oportunidade para a visibilidade de mulheres que atuam na linha de frente da luta do segmento. Foi o que destacou, por exemplo, o líder do Psol, Guilherme Boulos (SP).
“Este momento é histórico porque, com a criação do Ministério dos Povos Originários, com a eleição de uma bancada do cocar, aqui na Câmara pela primeira vez mulheres indígenas estão tendo voz no parlamento deste país, que tem uma dívida histórica com os povos indígenas, e [isso vem] depois de quatro anos de massacre e genocídio.”
A chamada “bancada do cocar”, como vem sendo apelidado o grupo que reúne parlamentares indígenas, inclui, além de Célia Xakriabá, a deputada Juliana Cardoso (PT-SP), do povo Terena. Sônia Guajajara também se elegeu para a Câmara em outubro de 2022, mas está licenciada para ocupar o cargo de ministra dos Povos Originários.
Edição: Rodrigo Durão Coelho