Com o endosso de Joe Biden à indicação da vice pelo Partido Democrata, voto de mulheres e de minorias pode ser decisivo na disputa pela presidência. Analistas veem alternativa à personalidade explosiva de Trump como diferencial
Favorita para representar os democratas nas eleições presidenciais dos Estados Unidos, Kamala Harris se prepara para assumir, possivelmente, a campanha do partido. A primeira mulher negra e de origem asiática a ocupar a vice-presidência dos EUA, e a segunda a se eleger senadora, agora tem a possibilidade de chegar à disputa pela Casa Branca e fazer história. Sua presença na corrida eleitoral deve ampliar a representatividade. Kamala prometeu derrotar o magnata republicano Donald Trump e sua agenda extrema do chamado "Projeto 2025". Ontem, ela trocou a imagem de capa do perfil na rede social X pela mensagem "Vamos ganhar isso".
Além da opinião de democratas influentes a favor da vice na liderança da chapa, como o
ex-presidente Bill Clinton e de sua esposa e ex-secretária de Estado, Hillary Clinton, pesquisas recentes apontam que Kamala poderia se sair melhor que Joe Biden como adversária de Trump.
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Marca registrada de Kamala, os direitos reprodutivos e a mobilização das mulheres são pautas frequentes em seus discursos, o que pode influenciar o eleitorado de forma positiva ou negativa. "Penso que a entrada de Kamala pode ser bastante importante para ampliar o apelo entre as mulheres e as minorias, bem como os mais jovens, que, até então, mantinham maiores restrições em relação à figura de Joe Biden. Além disso, ela é uma candidata com bagagem e experiência, o que também pode auxiliar na conquista do eleitorado moderado", expõe Clarissa Forner, professora de relações internacionais na Universidade São Judas Tadeu (em São Paulo).
Por outro lado, o tempo é uma variável importante. "A convenção do partido ocorrerá em breve e não houve um trabalho anterior, nos últimos quatro anos, para tornar Kamala uma candidata mais viável e consolidada. Como indicado, o conservadorismo é um elemento muito presente na política norte-americana, e o fato de estarmos falando de uma mulher afroamericana, infelizmente, também pode trazer limitações em algumas faixas do eleitorado. Também há as dificuldades envolvendo o próprio Partido Democrata. Caso não haja um esforço de construção de unidade, nas próximas semanas, isto também pode enfraquecer a candidatura dela", afirma a especialista ao Correio.
Voto feminino
Os votos das mulheres e das minorias democratas serão muito importantes para fortalecer o nome de Kamala na disputa, mas uma parcela conservadora ainda está inclinada a Trump. "É muito importante clarificar que nós estamos falando sobre mulheres e minorias democratas porque, em 2020, mais do que a maioria das mulheres brancas votaram em Trump. Essas mulheres não vão votar na vice-presidente. Entre as minorias democratas, acho que ela vai receber muito apoio das mulheres negras", afirma Gladys Mitchell-Walthour, pós-doutora e professora na Universidade de Carolina do Norte Central.
Em um embate direto entre Kamala e Trump, espera-se fortes contrastes. "Ela é extremamente inteligente, equilibrada e calma, o oposto de Trump. Ela vai mostrar a diferença entre os dois e vai ser claro quem pode lidar e fazer decisões importantes para os Estados Unidos. Claro que os fãs e seguidores de Trump vão achar que a personalidade explosiva dele é uma força, mas o eleitorado dos estados independentes pode decidir com base nas diferenças entre os dois", acrescenta Mitchell-Walthour.
Solução ou caos?
Apesar de a substituição ser aparentemente positiva, renovando os ares da eleição, Eric Heberlig, professor de ciência política da Universidade da Carolina do Norte, demonstra preocupação com a indecisão do Partido Democrata diante da aparente estabilidade na chapa de Trump. "Na medida em que Trump está à frente devido ao desempenho da administração Biden na economia ou na imigração, substituir Biden pela vice-presidente Harris não ajudará os democratas porque ela, provavelmente, será responsabilizada por eleitores que não gostam do desempenho ou das políticas da administração", disse. E alertou: "Se os eleitores comuns considerarem essa mudança nos candidatos um 'caos', isso também prejudicará os democratas, à medida que figuras fortes como Trump se oferecem, quando necessário, para proporcionar estabilidade e segurança quando o mundo parece estar desmoronando."
Ativista por natureza
Filha de imigrantes — mãe indiana e pai jamaicano —, Kamala Harris, 59 anos, nasceu na cidade de Oakland, no estado da Califórnia. Foi promotora distrital em San Francisco por dois mandatos, entre 2004 e 2011, e, em seguida, foi eleita duas vezes procuradora-geral da Califórnia, até 2017. No mesmo ano, tomou posse no Senado em Washington, onde se tornou a primeira mulher do sul da Ásia e a segunda senadora negra da história.
Responsável por tocar a campanha Luta pelas Liberdades Reprodutivas, foi destaque na defesa dos direitos das mulheres, sobretudo após a proibição do aborto pela Suprema Corte em 2022. Teve recorde de maior número de votos de desempate por um vice-presidente na história do Senado e papel crucial na aprovação da Lei de Redução da Inflação e do Plano de Resgate Americano, que forneceu financiamento emergencial durante a pandemia de covid-19.