Parlamentar carioca participou do encontro de mulheres nesta quinta (12) com as candidatas Maria do Rosário e Tamyres
"Essa dobradinha tem um preço e incomoda. Ela ainda não é possível na política do mundo de hoje, vocês desafiaram, se colocaram e terão que segurar essa barra” - Foto: Katia Marko
“Vocês terão olhares não só porque são duas mulheres, mas porque são duas mulheres com uma vice-prefeita negra e isso tem um preço. Essa dobradinha tem um preço e incomoda. Ela ainda não é possível na política do mundo de hoje, vocês desafiaram, se colocaram e terão que segurar essa barra.”
A afirmação foi feita pela deputada federal Benedita da Silva (PT), do Rio de Janeiro, em encontro de mulheres promovido por Maria do Rosário (PT) e Tamyres Figueira (Psol), candidatas à prefeitura de Porto Alegre, nesta quinta-feira (12). Com auditório repleto, a parlamentar enalteceu o empoderamento feminino e a luta das mulheres nos espaços de poder. O encontro contou com intervenção artística das Irmãs Vidal, com músicas como Maria, Maria, de Milton Nascimento.
Ao abrir sua intervenção, Benedita, dirigindo-se à Rosário e a Tamyres, ressaltou o que as une. “Essa é minha irmã gêmea (Rosário) e essa daqui é a minha face, a minha semelhança, ela é a minha imagem. Ela é aquilo que a gente trabalha há muitos e muitos nos para que os partidos políticos, todos eles possam ter esse espaço garantido, de nós mulheres negras, a maior população do Brasil”, afirmou.
Em sua fala, a parlamentar mesclou sua trajetória e a relação com Rosário, especialmente sua atuação na Câmara dos Deputados. “Se essa mulher em momentos difíceis para nós, foi capaz de construir, fomentar e de formular uma política de direitos humanos para o Brasil, porque não foi uma coisa fácil, o que não farão essas duas juntas por essa cidade.”
Ponto de partida, a cidade
“A gente quer também que todas as pessoas entendam que é na cidade que a gente vive, é aqui que se constrói, e essa aliança, essa frente deve estar traduzida não só na prefeitura ou na Câmara de Vereadores, ela deve ser o nosso projeto que deveríamos ter feito antes porque sozinhos não iremos a lugar nenhum, mas essa frente pode ir aonde essas mulheres quiserem”, afirmou.
Aos 82 anos, 42 deles dedicados à vida pública, Benedita foi a primeira mulher negra a ocupar um assento na Câmara de Vereadores do Rio de Janeiro, em 1983. Em sua fala ela destacou as discriminações sofridas como no episódio de quando perguntaram como ela ia lidar com aquelas artes que tinham no Palácio, com aqueles tapetes, aquelas peças, aquelas mesas de Dom Pedro. “Eu disse: eu juro, eu sou a pessoa mais preparada para morar naquele Palácio. Sabe por quê? Porque a maior parte da minha vida eu passei limpando tapete, limpando cristal”, contou, arrancando lágrimas.
Conforme afirmou, nas mais de quatro décadas dedicas à política, teve muitos sonhos realizados. “Morando numa favela, eu sonhava que era possível urbanizar. Por que não podíamos colocar água numa favela? Por que não poderíamos ter uma luz elétrica na favela? Por que nós tínhamos que pisar na lama, que muitas das vezes tinha que enfiar algo no pé para poder sair de casa, para poder passar pela lama e pegar lata d'água na cabeça escorregando. Eu nunca me conformei com isso. E eu sempre dizia que tem que acontecer alguma coisa. Mas para mudar o mundo, a prefeitura, é preciso primeiro que a gente mude. E vocês fizeram isso, fizeram o dever de casa, essa frente para mim é isso”, ressaltou.
Ela também deixou um recado às candidatas das periferias: "Levante a cabeça e vai com o teu povo. Nós não perdemos a nenhuma burguesia, porque ela jamais vai se colocar. Você precisa confiar na sua comunidade, você precisa confiar na sua base, você precisa confiar naquelas pessoas que pensam igual a você".
“Agora é a nossa vez, o nosso momento de dizer que temos cabeça para governar, sabemos governar. Quando uma mulher está em uma gestão, ela pensa grande, não pensa só no nosso corpo que nos pertence, ela pensa nos corpos que não têm quem defenda. Ela vai pensar na saúde, na educação, ela vai pensar na cultura, ela vai pensar em tudo. Nós somos um bombril, mil e uma utilidades”, afirmou.
“São as eleições das nossas vidas"
“Vamos como o verdadeiro motor, o verdadeiro coração que alimenta de esperança esse momento da cidade de Porto Alegre. Faço saudação a cada candidata a vereadora de todos os partidos. Conseguimos fazer algo raro, criamos uma unidade popular, programática para uma mudança profunda na nossa cidade”, afirmou Maria do Rosário.
A candidata recordou as mulheres que exerceram a missão de serem candidatas em eleições passadas como Manuela D'Ávila, que conforme pontuou está nos últimos dias lutando por todas as mulheres no Brasil que sofrem violência política, junto ao Supremo Tribunal Federal. E também Fernanda Melchionna que deu à luz a poucos dias a Dandara.
Rosário falou da construção da frente para a disputa da prefeitura da Capital. “Mulheres e homens com senso maior de responsabilidade de sete partidos políticos que fizeram a unidade para transformar Porto Alegre. Esta frente continua crescendo porque é também a representação do movimento popular e social. O diálogo com entidades e com as causas mais importantes, da diversidade, do respeito, da dignidade humana, dos direitos fundamentais. E nessa jornada que nós estamos fazendo na nossa Porto Alegre, em diálogo, inclusive, com a dimensão e responsabilidade metropolitana.”
Para ela é o momento, sobretudo para as mulheres, de selar um pacto com a população, fazendo o chamamento às pessoas para que ocupem o seu lugar de cidadania para opinarem e decidirem o seu futuro, o futuro da cidade.
A candidata ressaltou o momento que se vive pós-enchente, sobretudo em Porto Alegre. “Não foi uma tragédia de ordem natural, porque há de um lado o abandono à responsabilidade ambiental e, de outro, o abandono à estrutura de proteção das famílias, das casas, dos empregos, da vida cotidiana das pessoas, quando não houve manutenção do sistema de proteção da cidade pela sua atual administração.”
Segundo Rosário, o negacionismo climático, somado ao abandono da estrutura e do cuidado e de serviços básicos com a cidade, jogou milhares de pessoas para fora das suas casas. “Todos os seus pertences colocados no chão, as águas que tomaram, casas, ruas, bairros, escolas, unidades de saúde e tudo, o Mercado Público, o Centro e até muito próximo de onde nós estamos agora. Porto Alegre vive diante de uma administração que não é responsável, que não age adequadamente para uma cidade, para uma prevenção, para uma vida, desrespeitando o povo da nossa cidade”, frisou.
“A gente vem percorrendo vários territórios, vilas, bairros, comunidades. Vemos que não temos uma saúde pública de qualidade, uma educação pública de qualidade, um transporte decente para termos acesso ao direito à cidade. Vemos que essas pessoas que mais são impedidas de acessar esses serviços têm gênero, têm corpo, têm cor. São mulheres, trabalhadoras da periferia, sobretudo mulheres negras”, ressaltou Tamyres.
Conforme frisou a atual eleição não é um pleito qualquer. “São as eleições das nossas vidas. E temos que agarrar esse momento. Sabemos que essa disputa é muito difícil, porque de um lado eles colocaram uma mulher só pra dizer que tem mulher. Sabemos que é uma mulher que está ali pra retirar os nossos direitos, pra excluir o nosso povo das decisões. Ela que é do mesmo partido do Bolsonaro. Então fazermos esse contraponto na nossa campanha, com as nossas candidaturas, é mostrar que temos que fazer isso”, finalizou.
“Por todas as meninas, por todas as famílias, sejam quais forem, como forem, por todos os direitos sociais, econômicos, de inclusão, desenvolvimento. Pela educação, saúde, pela superação da fome, do medo, da violência contra a mulher. Pela construção de uma sociedade mais justa, a partir do território, do chão que a gente pisa, do saneamento básico, de uma cidade onde mães, avós não tenham medo da chuva na madrugada por morarem no Sarandi, Vila Farrapos, no centro da cidade. De uma cidade que passa valer-se do sentido de participação e construir a verdadeira transformação”, concluiu Rosário.
Edição: Katia Marko