O termo “mãe solo” surgiu para substituir o de mãe solteira, considerado depreciativo por mulheres que lutam para criar sozinhas os seus filhos

  Publicado: 07/11/2022
Por  - Jornal da USP


A difícil arte de ser mãe solo e desvencilhar-se do preconceito que cerca o ser “mãe solteira” – Foto: Freepik

 

Assumir a maternidade de forma autônoma é um desafio que milhares de mulheres enfrentam em todo o mundo. Conhecidas como “mães solteiras”, as mulheres lutam para mudar o termo, que carrega concepções depreciativas, já que, para ser mãe, não é preciso necessariamente ter um companheiro. No Brasil, segundo dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), o número de mães solo, ou seja, que criam os filhos sozinhas, saltou de 10 milhões para mais de 11,5 milhões de 2005 a 2015.

Essa realidade vem se contrapondo ao que a sociedade atribui, historicamente, como papel da mulher, que é o de cuidar do lar e do filho. Segundo a pós-doutora pela Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras de Ribeirão Preto (FFCLRP) da USP, Dantielli Assumpção Garcia, “esse comportamento cabia dentro de um modelo tradicional de família, construindo a ideia de que, para ser mãe, é preciso estar casada ou ter um companheiro”.

O termo “mãe solteira” se popularizou ao longo dos anos para designar essas mulheres que criam seus filhos sozinhas. No entanto, como esclarece a especialista em análise de discurso e feminismo, a maternidade não está relacionada com o estado civil da mulher. “É interessante pensar nisso, porque parece que essa mulher não poderia ser mãe se não fosse dentro de um casamento”, conta Dantielli.

O termo “mãe solo” surgiu, então, como uma tentativa de desvincular a maternidade com o estado civil da mulher. O termo acolhe essas mães que, sozinhas, seja por opção ou por abandono paterno, assumem o compromisso de criar e educar seus filhos, em um caminho cheio de desafios, que vai do julgamento da sociedade às dificuldades financeiras e psicológicas.

As dificuldades da maternidade autônoma


Dantielli Assumpção Garcia – Foto: Arquivo pessoal

Na rotina da mãe que cria os filhos e filhas sozinha nem tudo são flores. “Nós temos que pensar como o ser mãe solo envolve um esforço, um trabalho muito grande dessas mulheres”, comenta. Sem a presença de um companheiro, toda a responsabilidade da criação de um filho fica destinada à mãe. Além da necessidade de trabalhar para sustentar sua família, a mulher precisa cuidar da sua casa, da alimentação, da educação e de todas as tarefas relacionadas à vida doméstica.

Para além dos desafios no cotidiano, a mulher que assume a maternidade sozinha sofre um julgamento por parte da sociedade, ainda muito vinculada a valores patriarcais e machistas. “Esse julgamento faz com que ela se sinta discriminada, abandonada e sozinha. Então, essa mulher vai ter que lidar também com a sua saúde mental”, complementa Dantielli.

Essa sobrecarga da mãe solo pode levar a mulher ao limite do estresse, ocasionando uma exaustão tanto mental quanto física. Não ter alguém para dividir os problemas, dialogar ou receber apoio faz com que a jornada dessa mulher seja solitária. Muitas vezes, o lazer é deixado completamente de lado, deixando-a imersa no universo da maternidade e esquecendo da sua individualidade e felicidade como mulher.

Tendência de crescimento no número de mães solo

Apesar das dificuldades que as mulheres enfrentam nessa jornada, os dados indicam uma crescente no número de crianças registradas sem o nome do pai.  O Portal da Transparência do Registro Civil mostrou que, nos primeiros sete meses de 2022, mais de 100 mil crianças foram registradas apenas com o nome da mãe na Certidão de Nascimento, indicando um aumento no número de mulheres que criam seus filhos e filhas sozinhas.

Para Dantielli, essa tendência no crescimento é um reflexo da própria estruturação da sociedade, que ainda impõe à mulher a necessidade de ser mãe e de vivenciar a maternidade. “Não é dado à mulher o direito dela escolher se quer ou não ser mãe, isto é imposto. Socialmente a mulher deve ser mãe”, completa a especialista. 

No entanto, isto não acontece com o homem que, mesmo quando gera um filho, é permitido, perante os olhos da sociedade, se ausentar sem que haja julgamentos. “A nossa sociedade autoriza o homem a se ausentar, a não escrever seu nome de pai, diferentemente da mãe”, conclui Dantielli.

 

fonte: https://jornal.usp.br/campus-ribeirao-preto/vincular-a-maternidade-ao-estado-civil-pode-ser-depreciativo-para-as-mulheres/

 


Inscreva seu email

Cfemea Perfil Parlamentar

logo ulf4

Aborto Legal

aborto legal capa

Direitos Sexuais e Reprodutivos

logo ulf4

Cfemea Perfil Parlamentar

logo ulf4

Tecelãs do Cuidado - Cfemea 2021

Violência contra as mulheres em dados

Rita de Cássia Leal Fonseca dos Santos

Ministério do Planejamento
CLIQUE PARA RECEBER O LIVRO (PDF)

marcha das margaridas agosto 2023

Estudo: Elas que Lutam

CLIQUE PARA BAIXAR

ELAS QUE LUTAM - As mulheres e a sustentação da vida na pandemia é um estudo inicial
sobre as ações de solidariedade e cuidado lideradas pelas mulheres durante esta longa pandemia.

legalizar aborto

Artigos do Cfemea

Mulheres do Distrito Federal se preparam para receber a Marcha das Margaridas. Cfemea presente!

Dezenas de ativistas do Distrito Federal se reuniram em Plenária para debater e construir a Marcha das Margaridas. A marcha já é um dos maiores eventos feministas antirracistas do Brasil.

Congresso: feministas mapeiam o conservadorismo

Pesquisa aponta: só mobilização pode superar conservadorismo do Congresso. Lá, 40% alinham-se ao “panico moral”; 57% evitam discutir aborto; 20% são contra atendimento às vítimas e apenas um em cada cinco defende valores progressistas

Eleições: O “feminismo” de fundamentalistas e oligarcas

Candidaturas femininas crescem no país, até em partidos conservadores. Se o atributo de gênero perde marcas pejorativas, desponta a tentativa de passar ao eleitorado uma receita morna de “defesa das mulheres” – bem ao gosto do patriarcado

A pandemia, o cuidado, o que foi e o que será

Os afetos e o cuidar de si e dos outros não são lugar de submissão das mulheres, mas chave para novas lutas e processos emancipatórios. Diante do horror bolsonarista, sangue frio e coração quente são essenciais para enfrentar incertezas, ...

Como foi viver uma Campanha Eleitoral

ataques internet ilustracao stephanie polloNessa fase de campanha eleitoral, vale a pena ler de novo o artigo que Iáris Cortês escreveu uns anos atrás sobre nossa participação em um processo eleitoral

Dezesseis anos da Lei 11.340, de 07/08/2006, Lei Maria da Penha adolescente relembrando sua gestação, parto e criação

violencia contra mulherNossa Lei Maria da Penha, está no auge de sua adolescência e, se hoje é capaz de decidir muitas coisas sobre si mesma, não deve nunca esquecer o esforço de suas antepassadas para que chegasse a este marco.

Como o voto feminino pode derrubar Bolsonaro

eleicoes feminismo ilustracao Thiago Fagundes Agencia CamaraPesquisas mostram: maioria das mulheres rechaça a masculinidade agressiva do presidente. Já não o veem como antissistema. Querem respostas concretas para a crise. Saúde e avanço da fome são suas principais preocupações. Serão decisivas em outubro. (Ilustração ...

Direito ao aborto: “A mulher não é um hospedeiro”

feministas foto jornal da uspNa contramão da América do Sul, onde as mulheres avançam no direito ao próprio corpo, sociedade brasileira parece paralisada. Enquanto isso, proliferam projetos retrógrados no Congresso e ações criminosas do governo federal

As mulheres negras diante das violências do patriarcado

mulheres negras1Elas concentram as tarefas de cuidados e são as principais vítimas de agressões e feminicídios. Seus filhos morrem de violência policial. Mas, através do feminismo, apostam: organizando podemos desorganizar a ordem vigente

Balanço da ação feminista em tempos de pandemia

feminismo2Ativistas relatam: pandemia exigiu reorganização política. Mas, apesar do isolamento, redes solidárias foram construídas – e o autocuidado tornou-se essencial. Agora, novo embate: defender o direito das mulheres nas eleições de 2022

nosso voto2

...