Para Casé Angatu, demarcação de terras e reconhecimento das violações contra indígenas não aldeados são fundamentais para reparar os crimes da ditadura militar
Texto: Silvana Salles
Arte: Joyce Tenório*
Primeira sessão de julgamento dos inéditos pedidos coletivos de anistia dos povos Guarani Kaiowá e Krenak, pela Comissão de Anistia do Ministério dos Direitos Humanos e da Cidadania (MDHC) - Foto: Lohana Chaves/Funai
Então, veja que importante essa pergunta, né? Conforme eu disse na questão anterior, nós somos povos, nós somos pessoas coletivas. O povo quilombola, o povo indígena, as comunidades ribeirinhas, as comunidades de mata, as comunidades de pescadores são coletivas. Nós agimos, pensamos, vivemos coletivamente. Então, esse é um precedente fundamental para que tantas outras comunidades indígenas e não indígenas, mas que vivem coletivamente, tenham os seus direitos garantidos perante o Estado brasileiro. Não só em relação à ditadura militar, mas também a reconhecer direitos da terra, direitos a formas de viver diferenciadas, direito à alteridade, espiritual, de formas de trabalhar e conviver com a natureza. É necessário que o Estado brasileiro perceba essa diversidade. A Comissão de Anistia, ao reconhecer a anistia coletiva, abre esse precedente extremamente positivo para que o Estado brasileiro perceba que, não só durante a ditadura militar-empresarial, os direitos coletivos têm que ser preservados e garantidos.
Você acha que a decisão da comissão pode dar visibilidade às violações contra os direitos dos povos indígenas, não só no passado, mas também no presente?
Ailton Krenak na ABL: "eu posso invocar mais do que 300"
Na mesma semana em que os povos Krenak e Kaiowá tiveram suas anistias coletivas reconhecidas pelo Estado brasileiro, o primeiro “imortal” indígena tomou posse da Cadeira nº 5 da Academia Brasileira de Letras (ABL) em cerimônia realizada na sexta-feira (5), no Rio de Janeiro. Ambientalista, escritor, poeta e filósofo, Ailton Krenak herdou a Cadeira 5 do historiador José Murilo de Carvalho, falecido em 2023. Ao tomar posse, Ailton Krenak saudou a diversidade dos povos indígenas.
“Desde que me convidaram ou me animaram para ocupar essa cadeira número cinco, eu me perguntava: ‘Será que nessa cadeira cabem 300?’. Como dizia Mário de Andrade, eu sou 300. Olha que pretensão. Eu não sou mais do que um, mas eu posso invocar mais do que 300. Nesse caso, 305 povos, que nos últimos 30 anos do nosso país, passaram a ter a disposição de dizer: ‘Estou aqui’. Sou guarani, sou xavante, sou caiapó, sou yanomami, sou terena”, disse Krenak.
Uma das propostas do escritor para a ABL é a criação de uma plataforma inspirada na experiência da Biblioteca Ailton Krenak, que disponibiliza on-line centenas de imagens, textos, filmes e documentos em línguas nativas. Para pesquisadores, professores da USP e lideranças indígenas, o novo “imortal” dará visibilidade para questões relacionadas à terra, meio ambiente e direitos dos povos indígenas e comunidades tradicionais.
Com informações da Agência Brasil
*Estagiária sob supervisão de Simone Gomes de Sá