O Centro Brasileiro de Estudos em Saúde lançou o número especial da Revista Saúde em Debate: “Políticas e práticas de cuidado em HIV/AIDS: diálogos interdisciplinares”. De acordo com os editores, a publicação é o resultado de um conjunto de pesquisadores e profissionais de saúde de várias instituições de ensino e pesquisa com objetivo de conhecer, reunir e visibilizar pesquisas acadêmicas e análises de experiências sobre o cuidado em HIV/Aids no contexto atual.
“Pensamos em um conjunto de perguntas que esperávamos serem tratadas com a publicação deste número: O que é cuidado em HIV/AIDs? Em que espaços se produz cuidado? Que atores formam parte desse construto? Como os cuidados em HIV/AIDS têm sido produzidos em diferentes contextos brasileiros?”, afirmam.
Os editores também lembram que o impacto social da epidemia da AIDS ocupou um lugar central na resposta brasileira e, no entanto, vulnerabilidades vivenciadas pelas pessoas que vivem com HIV/AIDS como estigma, discriminação e exclusão social continuam como desafios.
Entre os/as pesquisadores que contribuíram com artigos estão Fátima Rocha, membro do Conselho Curador da ABIA. Fátima assina o artigo “A interface entre atenção primária e especializada em cenário de descentralização de cuidados em HIV/AIDS”, junto com Eduardo Melo, Rafael Agostini, Ana Carolina Maia e Ivia Maksud. O texto discute a interface entre Atenção Primária à Saúde (APS) e atenção especializada. Os autores mostram que APS tem se dado mais em uma lógica binária e de isolamento que em uma perspectiva de interação e gestão (compartilhada) do cuidado, que seria esperada em uma conformação de rede de atenção.
Simone Monteiro – que também é membro do Conselho Curador da ABIA – assinta o artigo “AIDS e prevenção: um olhar retrospectivo sobre projetos sociais com jovens no Rio de Janeiro”, junto com Vanessa do Nascimento Fonseca, Marcos Nascimento. O texto é estudo socioantropológico de dois projetos desenvolvidos na favela da Maré na década de 2000. O resgate da memória das intervenções sociais dá destaque às experiências de abordagem sociocultural sobre sexualidade desenvolvidas e que contrastam com os retrocessos evidenciados nas políticas de direitos sexuais e reprodutivos das duas últimas décadas.
Monteiro também assina o artigo “Irmandade travesti é a nossa cura: solidariedade política entre travestis e mulheres trans no acesso ao cuidado em saúde e à prevenção ao HIV”, junto com Aureliano Lopes da Silva Júnior e Mauro Brigeiro. No texto, os autores discutem as estratégias para o acesso aos serviços públicos de saúde e à prevenção ao HIV desenvolvidas por travestis e mulheres trans da região metropolitana do Rio de Janeiro. O artigo enfatiza as respostas geradas pelo grupo diante da violação de direitos humanos imposta e nos apresenta a agência de travestis e mulheres trans como forma de enfrentar as barreiras de acessos aos cuidados em saúde.
Sexualidade
Outro membro do Conselho Curador da ABIA, Felipe Rios, também participa da publicação com o artigo “Couro no couro: homens com práticas homossexuais e prevenção do HIV na Região Metropolitana do Recife”. Luís Felipe Rios escreveu o texto junto com Karla Galvão Adrião, Amanda Albuquerque e Amanda França Pereira. Os autores abordam as práticas sexuais e a prevenção do HIV nos circuitos de HSH da Região Metropolitana do Recife. Com metodologia quantiqualitativa, o artigo dá visibilidade para regimes de prazer dissidentes da heterossexualidade e apresenta caminhos para possíveis ações preventivas que incorporem essas práticas e seus sentidos para o grupo pesquisado.
A colaboradora da ABIA Carla Rocha Pereira também assina um artigo na publicação: “Sexualidade, sociabilidade, trabalho e prevenção do HIV entre populações vulneráveis na pandemia da Covid-19” tem a assinatura de Carla ao lado de Marly Marques da Cruz e Vanda Lúcia Costa. As autoras abordam sobre o impacto da Covid-19 no acesso de Homens que fazem Sexo com Homens (HSH) e mulheres trans/travestis a tecnologias de prevenção do HIV em Curitiba/PR.
Prevenção
O número temático também é composto por cinco ensaios que dialogam de forma contundente com (variados) conceitos de cuidado. Entre eles, um ensaio escrito por Gabriela Junqueira Calazans, Richard Parker (diretor-presidente da ABIA) e Veriano Terto Jr (vice-presidente da ABIA). “Refazendo a prevenção ao HIV na 5ª década da epidemia: lições da história social da AIDS” analisa os desafios e respostas diante da Aids nos seus 40 anos. A partir da história no campo da prevenção, os autores sugerem prioridades para a prevenção na 5ª década vindoura, apresentam princípios ético-políticos que fundamentaram respostas bem-sucedidas à AIDS no Brasil, e apontam caminhos para, como escreveram, “reimaginar a prevenção”. Acesse também a publicação sobre este tema lançada pela ABIA aqui.
O número temático da Revista Saúde em Debate traz ainda um Relato de Experiência escrito por Daniele Souza, Carla Pereira e Juan Raxach, que apresentam o livro ‘E se fosse com você? Histórias vividas de estigma e discriminação em 40 anos de HIV/AIDS’, publicação da ABIA que reúne relatos emocionados, em forma de conto, de dez sujeitos afetados diretamente pelo HIV/AIDS. Seu intuito é estimular a solidariedade com esse grupo, abordando os desafios do julgamento moral, transfobia, violências LGBTQIA+, capacitismo, entre outros, mas também trazendo históricas de reinvenção da própria vida.
Entrevista com Richard Parker
A edição é finalizada com uma entrevista “Políticas de HIV/AIDS, ativismo e antropologia: conversando com Richard Parker”, da qual participaram, além do entrevistado, Mónica Franch, Luziana Silva, Geissy Reis, Marcos Carvalho e Vagner Almeida. Richard Parker, além de diretor-presidente da ABIA, é antropólogo e ativista que se configura como um dos atores centrais da resposta brasileira à epidemia de HIV/AIDS. Na entrevista, Parker fala sobre sua trajetória como antropólogo e sua aproximação com a temática da AIDS. Também faz uma reflexão sobre os 40 anos da epidemia, dando ênfase às conquistas e aos desafios no seu enfrentamento e denunciando o acelerado desmonte sofrido pelas políticas e serviços voltados ao HIV e à AIDS nos últimos anos. A reflexão sobre os aprendizados nesse caminho nos inspira e convoca à produção de novas formas de resistir.
A edição completa da Revista Saúde em Debate pode ser acessada aqui