Quase lá: Por que uma defensora pública no Supremo Tribunal Federal?

Quem integra a defensoria aprende, por dever de ofício, a manejar o direito em prol de uma sociedade mais igualitária, menos excludente, buscando transformação social

Rivana Barreto Ricarte de Oliveira
Maira Maíra Coraci Diniz
postado em 01/06/2023 06:00 - Correio Braziliense
 
 (crédito: Ed Alves/CB/D.A Press)
(crédito: Ed Alves/CB/D.A Press)
 

No cenário político nacional, encontram-se em evidência as próximas nomeações a serem realizadas pelo presidente da República para composição do Supremo Tribunal Federal. Na discussão, são variadas as posições que se apresentam. Temos desde quem interdite qualquer debate sob variados pretextos, como o de que somente ao presidente cabe a escolha segundo suas convicções, ou de apoio irrestrito às escolhas presidenciais não importando quais sejam elas, passando por apresentações públicas de candidaturas, indicação de nomes por organizações e personalidades, pretensão de realização de sabatinas com possíveis candidatos.

De fato, a nomeação é do presidente da República, que pode indicar alguém com mais de 35 anos e menos de 70 anos de idade, de notável saber jurídico e reputação ilibada. Sendo que a nomeação dependerá de aprovação, por maioria absoluta, do Senado Federal. Há, portanto, nesse processo, a necessidade de convergência de vontades do Poder Executivo e do Poder Legislativo. O primeiro passo é do presidente da República, democraticamente eleito, que tem diante de si tarefa de enorme responsabilidade política por variadas razões. Primeiro porque se trata da composição do tribunal mais importante do Brasil, do responsável por fazer valer a Constituição e de dizer a última palavra sobre seu significado e aplicação. Segundo porque não são tão poucas assim as pessoas que cumprem os requisitos constitucionais embora se possa divergir quanto ao que significa "notável saber jurídico" e como aferir isso.

Com base tão somente nesses critérios, existem muitas pessoas, em todo o país, que estariam aptas a ocupar a posição. Isso torna o escrutínio muito maior e traz a necessidade de demonstração de outros critérios orientadores da escolha caso se queira agir com maior transparência e na busca de maior legitimidade, o que é desejável numa democracia.

Nosso intuito, portanto, é contribuir para a melhor escolha possível, adensando e qualificando esse debate, certos de que temos um presidente que se coloca como alguém aberto ao diálogo, que ouve e que gosta de uma boa conversa. Nesse sentido, queremos colocar no espectro de escolhas possíveis alguém que integre a Defensoria Pública.

No sistema de Justiça, a Defensoria Pública é a instituição mais jovem. Foi somente em 1988 que, pela primeira vez, passou a ter previsão constitucional, tornando-se a instituição a responsável por garantir o acesso à Justiça da população vulnerável. Acesso à Justiça que é direito constitucional fundamental. Desde então vem se estruturando, mas já mostrou a que veio quando combate o encarceramento em massa do povo preto, quando defende as mulheres em situação de violência e de discriminação de gênero, quando luta por dignidade para a população de rua, para as pessoas com deficiência, para a população LGBTQUIA . A instituição tem por missão garantir direitos sociais, combater a pobreza e exclusões, lutar contra a precarização do trabalho e contra as desigualdades sociais, defender o direito de acesso à educação de milhares de crianças e jovens e de uma velhice com dignidade de direitos, provocando o sistema de Justiça para garantir direitos às camadas mais pobres, vulneráveis e desfavorecidas de nossa sociedade.

Quem integra a defensoria aprende, por dever de ofício, a manejar o direito em prol de uma sociedade mais igualitária, menos excludente, buscando transformação social. Esse defensorar tem potencial de mudar o modo de atuar do sistema de Justiça trazendo ao Poder Judiciário as dores e sofrimentos da maior parcela da população brasileira, dos que passam fome, dos que estão vivendo em insegurança alimentar, dos que não têm acesso a água, terra e moradia.

Esse mesmo conjunto de atribuições nos faz defender também um sistema de Justiça inclusivo e representativo por dentro, com mais mulheres, pessoas negras, indígenas, com deficiência, de diversas orientações sexuais, identidades de gênero e de variadas camadas sociais. Por questão de justiça e porque representatividade importa.

A escolha para composição do tribunal é livre, respeitados os requisitos constitucionais. No entanto, eles, por si sós, nos levaram, até hoje, a uma composição marcada por um determinado espectro social hegemônico, marcado pela maioria branca e masculina.

O direito não pode tudo. Transformações dependem da política, das ações dos governantes e do necessário enfrentamento das questões sociais que foram aqui colocadas. O direito que é posto pelo STF tem que se compromissar com o projeto político constitucional de inclusão e de garantia de direitos para a maior parte da população desfavorecida do Brasil. Defensoria Pública presente do STF pode ser um bom começo.

* RIVANA BARRETO RICARTE DE OLIVEIRA presidente da Associação Nacional das Defensoras e Defensores Públicos (Anadep)

* MAIRA MAÍRA CORACI DINIZ, representante da Associação Defensoras e Defensores Públicos pela Democracia

 

fonte: https://www.correiobraziliense.com.br/opiniao/2023/06/5098676-artigo-por-que-uma-defensora-publica-no-supremo-tribunal-federal.html


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