Dados da Polícia Civil do Distrito Federal mostram um crescimento de 22% nos casos no primeiro semestre de 2023 em relação ao mesmo período de 2022. A legislação completou 17 anos no último dia 7 de agosto

Érika Tayna, sobrinha de vítima de feminicídio, na CLDF -  (crédito: Ísis Dantas/Divulgação)
Érika Tayna, sobrinha de vítima de feminicídio, na CLDF - (crédito: Ísis Dantas/Divulgação)
 
Foto de perfil do autor(a) Mila Ferreira
Mila Ferreira
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Pedro Marra
postado em 30/08/2023 06:00 / Correio Braziliense

 

Livrar-se do ciclo da violência é um dos maiores desafios para mulheres que sofrem nas mãos de agressores. O primeiro passo é ter coragem de denunciar e, neste aspecto, a situação tem evoluído no Distrito Federal. A quantidade de denúncias de violência contra a mulher no âmbito da Lei Maria da Penha aumentou 22% entre o primeiro semestre de 2022 e o mesmo período de 2023. Segundo os dados da Polícia Civil do DF (PCDF), obtidos pelo Correio, por meio da Lei de Acesso à Informação (LAI), nos primeiros seis meses do ano passado, foi registrado um total de 1,2 mil denúncias, sendo que, no primeiro semestre deste ano, o número aumentou para 1,5 mil casos. A lei, que completou 17 anos no último dia 7 de agosto, tem o objetivo de criar mecanismos para coibir a violência doméstica e familiar contra a mulher. Especialista ouvida pela reportagem atribui o aumentos das denúncias à eficácia de políticas públicas e campanhas de combate à violência contra as mulheres. No entanto, pontua que ainda há muito o que avançar nesta luta.

A maior parte das denúncias de casos de violência doméstica são registradas em regiões periféricas (veja quadro). Para a presidente da comissão de Segurança Pública da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB-DF), Ana Izabel Gonçalves de Alencar, o motivo é a falta de políticas públicas mais efetivas nas regiões mais carentes. "Precisa-se de uma política social mais efetiva nas periferias do Brasil, principalmente do DF. Embora a Justiça e a polícia estejam presentes para coibir e ajudar a elucidar os crimes, a quantidade de efetivo policial, como também o número de tribunais e delegacias para a mulher, é bem mais reduzidos", analisou a especialista.

"Quando a mulher não tem uma delegacia própria, ela se expõe em uma delegacia comum e encontra agentes despreparados, que tratam a violência contra a mulher como problemas de família. Esse tipo de abordagem desestimula bastante", explicou Ana Izabel.

Moradora de Ceilândia Norte, a estudante de psicologia Jiula Campos, 33 anos, conta que teve dificuldade para registrar boletim de ocorrência de agressão física e moral, quando o seu ex-companheira puxou o cabelo e segurou a filha dela, de 5 anos, pelo pescoço, no último fim de semana quando ele passeava com a filha. A menina pediu para se sentar ao lado de um amigo do pai, que não gostou do pedido e a violentou. "Ele deixa de ser um bom pai quando ele bate nessa criança. Fui na Deam 2, onde falaram 'vamos fazer a ocorrência, mas vai ser difícil. É o pai da sua filha'. Tentaram minimizar a violência por ser o pai da menina", relata a moradora da região.

Os dados da Polícia Civil, no segundo semestre deste ano, mostram que a maioria das violências são físicas (22%), seguidas da violência psicológica (8%) e da sexual (1%). Jiula diz que sofreu todos esses casos, inclusive a violência patrimonial, na qual o companheiro retém o dinheiro, destrói ou oculta bens e objetos, e não deixa a vítima trabalhar. "O que me motivou a fazer as denúncias foi a informação, os espaços que mulheres vêm ocupando e incentivando outras mulheres. Eu tinha passado pela violência física, mas não entendia a violência psicológica até assistir à palestra de uma psicóloga na faculdade", diz a estudante.

Misoginia

Ana Izabel Alencar destacou, ainda, a importância da concessão, por parte da Justiça, de medidas protetivas de proibição de aproximação e contato, quando solicitada. "Muitos juízes indeferem medida protetiva, porque entendem que devem preservar a liberdade do homem e que isso é mais importante do que proteger a mulher. Já vi vários casos", declarou Ana Izabel. "Infelizmente, ainda há misoginia e machismo. Muitas mães criam seus filhos reproduzindo como foram criadas. Muitos homens reproduzem comportamentos dos pais, que agridem as mães. As mulheres estão em um momento de maior independência, no sentido de trabalhar e estudar mais. Com isso, têm aberto caminhos em vários setores da sociedade, o que faz com que elas estejam mais conscientes do papel delas e entendendo que não podem mais ficar nesse lugar de opressão, de desvalorização", concluiu.

Uma das mulheres que tentou fugir das opressões foi a vendedora Izabel Guimarães, morta pelo ex-companheiro em fevereiro deste ano com tiro na cabeça, na frente da filha de 10 anos. O caso ocorreu em Ceilândia, região com mais denúncias de violência por Lei Maria da Penha no DF. A vítima trocou as fechaduras do portão antes de ser morta para impedir a entrada do agressor em casa.

Sobrinha dela, a bombeira Érika Tayná Nascimento, 28, conta que, após a tia morrer a família soube das violências e até encontrou um caderno com várias anotações de agressões sofridas pelo ex-companheiro. "Sabíamos que era um relacionamento de idas e vindas, e ele demonstrava alguns tipos de violência emocional e psicológica", relembra. Érika, que também é pesquisadora na área de violência doméstica em saúde coletiva, acredita que a rede de apoio é importante para a saúde integral da mulher: física, psicológica e emocional. "É importante ela ter um núcleo de amigos ou uma rede religiosa, onde consiga se apoiar para saber que não estará sozinha para quando for tomar a decisão de denunciar", analisa.

Audiência Pública

Durante a audiência pública da violência de gênero ao feminicídio: novos olhares e perspectivas de atuação, ontem, no plenário da Câmara Legislativa do Distrito Federal (CLDF), a deputada Dayse Amarílio (PSB), discutiu dados e propostas para trabalhar o tema com mais propostas e de maneira mais ampla. Junto de autoridades, especialistas, vítimas de violência doméstica e familiares de mulheres assassinadas por ex-companheiros, a parlamentar comentou que é preciso incorporar os homens nessa discussão.

"Muitos são acompanhados por núcleos de maneira forçada. Existe uma decisão judicial de que eles precisam fazer aquele acompanhamento para poder responder judicialmente por aquilo. Precisamos falar disso nas escolas, na comunidade", comentou Dayse, que também é presidente da Comissão de Assuntos Sociais (CAS) na CLDF.

Com uma exposição dos casos deste ano espalhados nas paredes da entrada e na subida do plenário da Câmara Legislativa, o evento teve o objetivo de debater os impactos da violência de gênero na capital federal e as perspectivas de atuação das diversas frentes envolvidas no combate ao feminicídio.

Dayse questionou qual mulher tem acesso ao aplicativo de denúncias, se há efetivo suficiente da segurança pública e se o assunto é debatido nas escolas do DF. "Esse machismo estrutural é o que tem matado as mulheres lentamente. Por isso que vamos debater a questão mais profunda do que leva ao feminicídio, que não acontece de uma hora para outra", finalizou a deputada distrital.

 

CID-Maria da Penha
CID-Maria da Penha(foto: Valdo Virgo)

 

Portaria Conjunta entre a Secretaria de Segurança Pública do DF (SSP-DF) e as Polícias Civil (PCDF) e Militar do DF (PMDF), publicada na última segunda-feira no Diário Oficial do DF (DODF), dará início ao fornecimento do aplicativo Viva Flor, para o monitoramento e proteção de vítimas de violência doméstica. As tratativas para garantir a distribuição do aplicativo em delegacias estão em curso. A medida será iniciada em formato de projeto piloto até dezembro deste ano nas delegacias especiais de Atendimento à Mulher 1 e 2 (Deam 1 e 2), localizadas na Asa Sul e Ceilândia, respectivamente. Após esse prazo, o projeto poderá ser expandido para outras unidades policiais.

O Programa de Segurança Preventiva Viva Flor existe desde 2017, por meio de atuação conjunta das secretarias de Segurança Pública e da Mulher, das forças de Segurança Pública (PCDF, PMDF, CBMDF), do Ministério Público, da Defensoria Pública e do Tribunal de Justiça do Distrito Federal e Territórios. Um dispositivo eletrônico, com aparência de celular, é entregue à vitima. Ele tem a função exclusiva de realizar o monitoramento e a proteção da vítima, a partir do acionamento prioritário do serviço de emergência da PMDF.

De janeiro a agosto de 2023, foram incluídas no programa 282 mulheres, por força de decisão judicial, e, atualmente, são acompanhadas um total de 380 mulheres.

SAIBA MAIS

Moral: caluniar, injuriar, difamar.

Física: empurrar, chutar, amarrar, bater, violentar.

Sexual: pressionar a fazer sexo, exigir práticas que a mulher não gosta, negar o direito a uso de qualquer contraceptivo.

Psicológica: humilhar, insultar, isolar, perseguir, ameaçar.

Patrimonial: reter seu dinheiro, destruir ou
ocultar bens e objetos,
não deixar trabalhar.

 

Peça ajuda

Polícia Militar do Distrito Federal (PMDF)

Ligue 190

Polícia Civil do DF (PCDF)

Ligue 197

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WhatsApp: (61) 98626-1197

Ligue 180 - Central de Atendimento à Mulher

Serviço registra e encaminha denúncias de violência contra a mulher aos órgãos competentes, além de reclamações, sugestões e elogios sobre o funcionamento dos serviços de atendimento.

Delegacias Especiais de Atendimento à Mulher (Deam)

Deam 1: Atende o DF, à exceção de Ceilândia.

Telefones: 3207-6172 / 3207-6195 / 98362-5673

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Deam 2: Atende Ceilândia.

Telefones: 3207-7391 / 3207-7408 / 3207-7438

Ministério Público do Distrito Federal e Territórios (MPDFT) - Núcleo de Gênero

Telefones: 3343-6086 e 3343-9625

E-mail: Este endereço de email está sendo protegido de spambots. Você precisa do JavaScript ativado para vê-lo.

Ligue 129, opção 2. Defensoria Pública do DF

Núcleo de Assistência Jurídica de Defesa da Mulher (Nudem)

Telefones: (061) 3103-1926 / 3103-1928 / 3103-1765

WhatsApp (61) 999359-0032

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fonte: https://www.correiobraziliense.com.br/cidades-df/2023/08/5120958-denuncias-de-lei-maria-da-penha-aumentam-no-distrito-federal.html

 


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