Quase lá: O supremacismo branco disfarçado na política

A baixa representatividade de negros(as) na política é um problema para toda a população e impede um desenvolvimento social necessário a todos(as).


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Uma das causas é a dificuldade dos candidatos negros de acessarem recursos para suas campanhas eleitorais e, consequentemente, se elegerem

A baixa representatividade de negros na política é um problema para toda a população e impede um desenvolvimento social necessário a todos. Por isso mesmo, a anistia às multas impostas aos partidos por não cumprirem as cotas destinadas ao financiamento das candidaturas de mulheres e de negros autodeclarados (pretos e pardos) seria um desserviço do Congresso à democracia brasileira. A proposta foi aprovada na Câmara, por iniciativa de seu presidente, Arthur Lira (PP-AL), cujo legado legislativo, se insistir nas pautas que vem apresentando, será um dos mais reacionários da história da Casa. Felizmente, o projeto de anistia das multas subiu no telhado do Senado, depois da insurgência do senador Renan Calheiros (MDB-AL), que apontou o caráter regressivo da proposta.

Apesar de todos os problemas em relação ao cumprimento da legislação eleitoral, daí o estoque de multas aplicadas aos partidos pela Justiça Eleitoral, as cotas destinadas ao financiamento de candidatos negros estão surtindo efeito, tanto quanto as das mulheres. Em 2022, de um total de 513 vagas para deputados federais no Congresso Nacional, foram eleitos 135 negros e pardos. Inédito foi o aumento significativo de mulheres negras eleitas para a Câmara dos Deputados, que passou de 13 para 29; porém, o número de homens negros ou pardos recuou de 111 para 106 no mesmo período. Uma das causas é a dificuldade dos candidatos negros de acessarem recursos para suas campanhas eleitorais e, consequentemente, se elegerem.

Segundo frei David Raimundo Santos, filósofo e teólogo, fundador do Educafro, nos processos eleitorais de 2014 e 2018, a disparidade na distribuição de recursos de campanha para candidatos homens negros em comparação com outros grupos já alertava para esse fenômeno, que levanta questões sobre exclusão e racismo estrutural no cenário político brasileiro. “A constatação de que, entre os candidatos competitivos, os homens negros receberam apenas 16% dos recursos de todos os tipos de doação de campanha, mesmo representando 21% dos candidatos a deputado federal, aponta para a confirmação de desigualdades estruturais”, avalia.

Frei David foi um dos artífices da retirada do projeto da pauta do Senado, cujos corredores e gabinetes percorreu, para tentar convencer os senadores do retrocesso que a anistia das multas por não cumprimento das cotas representaria. O religioso se notabilizou pela criação do Educafro, uma instituição que já garantiu o acesso de mais 60 mil jovens negros e muito pobres da periferia ao ensino superior. Sua tomada de consciência da condição de afrodescendente ocorreu quando iniciou a vida religiosa.

Mais espaços

“No seminário, éramos 37 seminaristas e só oito afrodescendentes. Percebi que os oito estavam em autonegação. Por que eu negava minha negritude? Então, houve um momento de discriminação muito forte comigo e decidi arrumar minha mala e ir embora. Um formador trabalhou comigo o seguinte: você sofre de uma doença, que se chama ideologia do embranquecimento. Você tem vergonha do seu cabelo, da sua cor, de tudo o que é ligado ao seu povo negro.”

Segundo Frei David, foi quando tomou a decisão que traçaria o seu destino: “Ali nasceu uma determinação: eu só aceito continuar a ser frade franciscano se for para dedicar minha vida a serviço da libertação do nosso povo negro no Brasil.” Já ordenado, num encontro com 100 jovens negros, descobriu que só dois pensavam em ir para a universidade. A partir daí, fundou o primeiro cursinho pré-vestibular comunitário para jovens negros do Brasil. Em um ano, eram mais de 2 mil pelo país. A Educafro, em mais de 30 anos, esteve à frente da luta pela lei das cotas nas universidades, do Prouni e, mais recentemente, do fundo eleitoral.

Uma das questões é a abertura de espaço para os negros nos partidos. De acordo com os números do TSE, nesse quesito, nas eleições de 2022, a direita venceu de goleada no número de eleitos autodeclarados pretos ou pardos em relação à esquerda. O placar foi de 77 a 31. Dos 135 eleitos, a direita elegeu mais da metade. Foram 25 pelo PL, 20 pelo Republicanos, 17 pelo União Brasil e 15 pelo PP. Nos partidos da esquerda, o PT elegeu 16 deputados negros. Pelo PDT foram seis; PC do B, quatro; PSB e PV, dois cada; e Rede elegeu um. Total de 31 deputados eleitos. Somados, os partidos do Centrão (MDB, PSD, Podemos, Avante e Pros) elegeram 27 deputados.

Em parte, o fenômeno se deve a ascensão do pensamento conservador nas famílias brasileiras e à presença significativa de negros nas igrejas pentecostais. No universo cristão, 59%, hoje, são evangélicos, o que representa 31% da população brasileira. Vem daí a ascensão de lideranças negras ultraconservadoras, como Fernando Holiday, Sérgio Camargo, Paulo Cruz, Hélio Bolsonaro e Guto Zacarias.

O problema é que essas lideranças negam a existência do racismo estrutural, que se manifesta por meio de estigmas, discriminações e violências. O apagamento da presença negra no Congresso é uma forma de supremacismo branco na política. “Exigir o investimento das verbas eleitorais nos homens negros, sem negligenciar o direito das mulheres negras, é um imperativo que a representação da população negra brasileira não pode abrir mão”, afirma frei David.

Todas as colunas anteriores no Blog do Azedohttps://blogs.correiobraziliense.com.br/azedo/

 

fonte: https://blogs.correiobraziliense.com.br/azedo/nas-entrelinhas-o-supremacismo-branco-disfarcado-na-politica/


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