O Governo Federal encaminhou o projeto do novo PNE em junho. Entre os objetivos específicos, destacam-se aqueles referentes à educação escolar indígena e quilombola, à educação do campo, à educação bilíngue de surdos e à educação especial
Rozana Naves - Doutora em linguística e professora do Departamento de Linguística, Português e Línguas
Clássicas da Universidade de Brasília (UnB) - Artigo publicado no jornal Correio Braziliense em 15/7/2024
No fim de junho, o governo federal encaminhou ao Congresso Nacional o projeto de lei do novo Plano Nacional da Educação (PNE) 2024-2034, que estabelece 18 objetivos para a educação brasileira. O documento tem foco na qualidade do ensino e propõe avanços no que se refere à equidade, como princípio transversal. Entre os objetivos específicos, destacam-se aqueles referentes à educação escolar indígena e quilombola, à educação do campo, à educação bilíngue de surdos e à educação especial.
A origem do PNE está na intensa participação da sociedade civil organizada e na capacidade de mobilização dos diferentes segmentos envolvidos na elaboração do plano. Os intensos debates entre a sociedade civil e os representantes do poder público municipal, estadual e federal, com contribuições feitas pelos Conselhos de Educação e da Conferência Nacional de Educação (Conae), demonstraram a relevância da participação social na conquista e na defesa dos direitos fundamentais da população.
O anúncio do novo PNE colocou em perspectiva a execução do atual Plano Nacional de Educação, elaborado em 2014, que registra apenas duas metas cumpridas (elevar a qualidade do ensino superior e a proporção de mestres e doutores nas faculdades e aumentar o número de matrículas de mestrado e doutorado), podendo completar a terceira meta (formar 50% dos professores da educação básica em pós-graduação e garantir formação continuada para todos) até o fim de 2025, prazo prorrogado pelo Senado Federal, no último mês de maio.
Uma das razões que explicam o não cumprimento das metas estabelecidas em 2014 são os sucessivos cortes orçamentários na área da educação, em particular dos efeitos nefastos da Emenda Constitucional 95 (teto de gastos). Isso expõe a relação crucial entre o financiamento público e a melhoria da qualidade da educação e, consequentemente, dos indicadores sociais do país. Como combater as desigualdades educacionais sem que sejam assegurados os recursos necessários para a implementação do PNE?
Vejamos o caso da educação superior. A consolidação da expansão do sistema, com inclusão social, e a ampliação das políticas de permanência e assistência estudantil exigem mais investimentos. De acordo com o portal Sou Ciência, da Universidade Federal de São Paulo (Unifesp), os recursos para financiar o custeio e a assistência estudantil caíram quase à metade: de R$ 8,6 bilhões em 2018 para R$ 4,4 bilhões em 2022. Ocorre que, já em 2018, segundo dados da V Pesquisa Nacional sobre o Perfil Socioeconômico dos(as) Graduandos(as) das Ifes (instituições federais da educação superior), 70,2% dos estudantes matriculados nas universidades e nos institutos federais pertenciam às classes sociais com renda mensal familiar per capita de até 1,5 salário mínimo, e 16,7% viviam com renda entre 1,5 e 3 salários mínimos.
Para alcançarmos as efetivas mudanças de que o país necessita — redução das desigualdades e justiça socioambiental —, é condição sine qua non promover a participação ativa e permanente da comunidade universitária no debate
É imperativo oferecer condições aos estudantes universitários de concluírem os seus cursos com bom desempenho. Para isso, e para alcançarmos as efetivas mudanças de que o país necessita — redução das desigualdades e justiça socioambiental —, é condição sine qua non promover a participação ativa e permanente da comunidade universitária no debate sobre a importância e na defesa da vinculação constitucional do orçamento da educação e da saúde.
A democracia, prática essencial para o desenvolvimento de sociedades em que inclusão, liberdade e igualdade sejam os valores predominantes, depende da consciência crítica dos(as) cidadãos(ãs). As escolas e universidades são espaços fundamentais para a construção dessa consciência. Daí a importância do fortalecimento dos processos democráticos internos nas universidades e da mobilização social para assegurar a todas as pessoas o direito constitucional à educação pública, gratuita, de boa qualidade e com equidade — da creche à educação superior.
Rozana Naves
Doutora em linguística e professora do Departamento de Linguística, Português e Línguas
Clássicas da Universidade de Brasília (UnB)