Sua trajetória surpreendente é lembrada no Dia da Mulher Negra Latino-americana e Caribenha, instituído pela ONU em 25 de julho. No Brasil, essa efeméride ocorre na mesma data que o Dia Nacional de Tereza de Benguela e da Mulher Negra.
A pintura de uma mulher negra feita pelo artista francês Félix Vallotton ("Femme noire assise de face"), foi feita em 1911 e é associada, no Brasil, à figura de Tereza de Benguela. Trata-se de uma arte de óleo sobre tela e de uma coleção privada. Domínio Público.
Tereza de Benguela é um nome que aos poucos vem se tornando mais conhecido na historiografia brasileira, principalmente graças à atuação dos movimentos negros e pelo regaste de memória dessas personalidades feito por datas importantes como o Dia da Mulher Negra Latino-americana e Caribenha, e o Dia Nacional de Tereza de Benguela, ambos celebrados anualmente em 25 de julho.
Segundo um artigo do Centro de Cultura, Linguagens e Tecnologias Aplicadas da Universidade Federal do Recôncavo da Bahia, não se sabe oficialmente onde Tereza de Benguela nasceu – se em algum país da África ou até mesmo no Brasil. Mas o que já se conhece é que ela foi uma mulher colocada em condição de escravidão e viveu no século 18 em uma região que hoje estaria dentro do estado do Mato Grosso, perto do Pantanal brasileiro.
Ainda de acordo com o documento, Tereza foi casada com um homem conhecido como José Piolho, que também viveu em condição de escravidão, e chefiava o Quilombo de Quariterê (ou “Quilombo Grande”). Quando ele foi assassinado por soldados do Estado brasileiro, Tereza assumiu o posto de líder da comunidade quilombola, que tinha cerca de 100 pessoas de origem indígena e negra, e conseguiu resistir à invasão e à escravidão por 20 anos.
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Mulheres dançam o Tambor de Mina seguindo tradições africanas em um quilombo em Codo, no estado do Maranhão. De acordo com dados do Censo do IBGE de 2022, a população quilombola no Brasil é de 1,32 milhão de pessoas – ou 0,65% do total de habitantes do país.
A trajetória da "Rainha Tereza" virou sinônimo de resistência
Na liderança do Quariterê entre 1750 e 1770, Benguela coordenou sua defesa e uma estrutura social que permitia aos integrantes ali viverem do cultivo de algodão, milho, feijão, mandioca, banana, e da venda dos excedentes da produção, bem como de tecidos feitos com o algodão de outra parte da colheita, segue explicando o artigo da universidade baiana.
Historicamente, se tornou notável o fato de Benguela ter montado uma administração dentro do quilombo que contava com um espaço destinado ao conselho, o qual funcionava parecido a um parlamento, destaca a fonte. "Tereza comandou a estrutura política, econômica e administrativa do quilombo, mantendo um sistema de defesa com armas trocadas com os brancos ou roubadas das vilas próximas. Os objetos de ferro utilizados contra a comunidade negra que lá se refugiava eram transformados em instrumentos de trabalho, visto que dominavam o uso da forja", completa o texto do Centro de Cultura, Linguagens e Tecnologias Aplicadas.
Comunidades quilombolas que resistiram à escravidão na época do Brasil Colônia seguem existindo no país. Na foto, 100 famílias vivem das florestas de palmeiras próximas ao vilarejo de Santo Antônio dos Pretos, no estado do Maranhão.
Como Tereza Benguela morreu?
Tereza de Benguela foi capturada em 1770, quando o quilombo foi invadido e destruído pelas forças de bandeirantes contratadas por Luiz Pinto de Souza Coutinho, governador da capitania do Mato Grosso. Parte da população (79 negros e 30 indígenas) foi assassinada e outra, aprisionada, detalha um documento do site da Superintendência de Inclusão, Políticas Afirmativas e Diversidade do governo federal do Brasil.
Já segundo o artigo da Universidade da Bahia, não existe registro oficial de como Tereza de Benguela morreu. Suspeita-se que ela possa ter se suicidado depois de ser capturada por bandeirantes a mando da capitania do Mato Grosso ou assassinada ainda no quilombo.
Um terceiro artigo, por sua vez, defende que Benguela teria sido capturada e levada para a prisão, onde teria definhado até morrer: "Presa na cadeia de Vila Bela, sua desaventura fica ainda pior ao ser tomada pela melancolia e tristeza profundas, em tormento, segundo alguns, negando a alimentar-se, recusando-se retornar à escravidão", diz o texto da plataforma online de história "Impressões Rebeldes", da Universidade Federal Fluminense, no Rio de Janeiro. Depois de morta, a cabeça de Tereza teria sido cortada e colocada em meio a praça do antigo quilombo para servir de exemplo a todos que a vissem, finaliza o documento.
Ou seja, de todas as formas, é praticamente certo que em seu fim de vida enfrentou a violência.
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Por que se celebra o Dia Internacional da Mulher Negra Latino-americana e caribenha
Criado pela ONU (Organização das Nações Unidas), em 1992, o Dia Internacional da Mulher Negra Latino-americana e Caribenha, celebrado em 25 de julho, tem o objetivo de fortalecer e reconhecer a união entre mulheres negras, latinas e caribenhas no combate ao racismo e machismo enfrentado nas Américas, como explica um artigo da Fundação Palmares – entidade oficial do governo federal brasileiro para a promoção da da afro-brasilidade.
No Brasil, em especial, soma-se a essa data a criação do Dia Nacional de Tereza de Benguela e da Mulher Negra, em 2014, cujo propósito é "dar visibilidade ao papel da mulher negra na história brasileira", explica a Fundação Palmares. "Este dia deve ser fortalecido com ações em reconhecimento ao protagonismo dessas mulheres na manutenção e preservação das tradições culturais afro-brasileiras", defende o texto.
Benguela também foi homenageada em 1994 durante um desfile de carnaval da escola de samba Unidos do Viradouro, no Rio de Janeiro. A tradicional agremiação carioca escolheu a líder quilombola como tema de seu samba enredo. Ele tinha o nome de "Tereza de Benguela – Uma Rainha Negra no Pantanal". Já em 2020 foi a vez da escola de samba Barroca Zona Sul, de São Paulo, homenagear a líder negra com um desfile sob o samba-enredo: “Benguela… a Barroca Clama a Ti, Tereza!”.