Quase lá: Enfermeira, profissão coragem

Às vésperas da votação que pode garantir, enfim, o piso salarial, pesquisadora expõe os dramas e lutas da categoria. Maltratadas, precarizadas e mal-pagas elas estão virando o jogo e se tornando, em todo o mundo, protagonistas da luta por direitos

 


Foto: Sérgio Lima

 

Maria Helena Machado, em entrevista a Gabriela Leite, no PULSO

A expectativa é que amanhã (26/4) seja votado, em sessão conjunta do Congresso Nacional, o Projeto de Lei enviado pelo presidente Lula que garante as fontes de custeio para o Piso Nacional da Enfermagem. Trata-se de uma luta de décadas, que tomou tração após o início da pandemia de covid-19. Em 2022, o Congresso aprovou uma PEC que estabelece o salário mínimo de R$ 4.750 para enfermeiras, R$ 3.325 para técnicas e R$ 2.375 para auxiliares de enfermagem e parteiras. São 2,9 milhões de trabalhadores, que constituem 72,5% da força de trabalho da saúde.

 

Para refletir sobre as condições dessas profissionais, para além dos vencimentos, o PULSO, programa de entrevistas do Outra Saúde, convidou uma pessoa muito especial. Maria Helena Machado, da Escola Nacional de Saúde Pública Sérgio Arouca (ENSP/Fiocruz), coordena algumas das principais pesquisas sobre essa categoria de trabalhadores, em especial o Perfil da Enfermagem no Brasil e dois outros amplos estudos sobre a sua situação durante a pandemia. 

Na entrevista, a pesquisadora expôs algumas das principais carências da Enfermagem e como o novo piso salarial pode ajudar a dar garantias mínimas e diminuir as disparidades que enfrentam. Seus estudos deixam claro como essas trabalhadoras – que são em grande maioria mulheres – se submetem a longas jornadas, muitas vezes sem equipamentos de proteção eficazes e sem receber o mínimo para construir uma vida digna. Muitas das profissionais de nível técnico precisam, inclusive, ter mais de um emprego ou buscar outros “bicos” – de babá, diarista, motoboy…

Segundo estudo do Dieese, 85% dos técnicos de enfermagem ganham abaixo do piso estipulado pela PEC. Também é o caso de 56% dos enfermeiros e 52% dos auxiliares de enfermagem. Para Maria Helena, “mais que o salário e qualquer outra coisa, a questão principal deles é a de falta de sentimento de proteção, no lugar onde estão trabalhando. Não são vistos como essenciais. É uma situação em que o trabalhador adoece”. Ela lamenta: “O Sistema Único de Saúde trata mal seus trabalhadores”.

O cenário, que já era ruim, piorou na pandemia. “Não é verdade que a população trata os enfermeiros como heróis. Não é assim que os trabalhadores se sentem”, relata Maria Helena. Ela explica que a violência se deu em três níveis. No trabalho, onde além de não haver equipamentos suficientes os profissionais eram submetidos a violência e grosseria dos pacientes. No trajeto para o trabalho, quando a maior parte das cidades diminuiu as frotas do transporte público. E também no ambiente doméstico, onde sofreram discriminação por serem vistos como vetores do vírus da covid.

Esses fatores foram ignorados em larga escala pelos poderes públicos, em especial a presidência da República, que se negava a fazer uma gestão decente da pandemia – sempre argumentando que se tratava de um exagero, que a crise já estava no fim. O resultado foi que o Brasil ficou entre os países com mais mortes de profissionais da saúde do mundo. Segundo os dados do Conselho Federal de Enfermagem, o país perdeu 200 enfermeiros e 470 auxiliares e técnicos. Mas Maria Helena afirma que não há números precisos e que não é possível saber, de fato, qual foi o total de óbitos. “Esses trabalhadores morreram por descuido, por desproteção. É inadmissível o que o ministério da Saúde do Governo Bolsonaro fez com eles. Isso tem que ser realçado”, defende a pesquisadora.

Maria Helena frisa a importância de se perceber a desigualdade de gênero entre os profissionais da saúde. Elas são 85% dos profissionais da Enfermagem no Brasil, e são um retrato da disparidade do país. “Tem um lado extremamente positivo, honroso, saber que nós mulheres comandamos um setor vital para a humanidade”, afirma, mas esse trabalho não é valorizado como deveria. “Essas mulheres têm que se desdobrar na dupla – e às vezes tripla – jornada de trabalho. Trabalham 12, 15 horas por dia, e quando chegam em casa têm os afazeres domésticos, de cuidado dos filhos e da manutenção do ambiente familiar.” E, no período em que deveriam estar descansando, precisam ir em busca dos “bicos”… 

Embora sejam uma classe de quase 3 milhões de trabalhadores, esse contingente ainda está aquém do necessário no Brasil. Mas Maria Helena acredita que nos próximos anos vai haver uma grande transformação, conduzida pelas enfermeiras. “A Enfermagem é a protagonista de uma mudança radical que vai acontecer na Saúde de modo geral. O mundo do trabalho da saúde vai mudar. Vai haver ainda mais profissionais de nível superior. O país precisa se preparar e arrumar recursos para pagar esses trabalhadores.”

  https://outraspalavras.net/outrasaude/enfermeira-profissao-coragem/" target="_blank" rel="noopener" class="show-for-large" style="box-sizing: inherit; background-color: rgb(255, 255, 255); line-height: inherit; color: rgb(64, 113, 144); text-decoration: none; cursor: pointer; font-size: 26px; padding: 0px 15px; margin-right: -4px;"> https://outraspalavras.net/outrasaude/enfermeira-profissao-coragem/" target="_blank" rel="noopener" style="box-sizing: inherit; background-color: rgb(255, 255, 255); line-height: inherit; color: rgb(64, 113, 144); text-decoration: none; cursor: pointer; font-size: 26px; padding: 0px 15px; margin-right: -4px;">

Matérias Publicadas por Data

Artigos do CFEMEA

Coloque seu email em nossa lista

lia zanotta4
CLIQUE E LEIA:

Lia Zanotta

A maternidade desejada é a única possibilidade de aquietar corações e mentes. A maternidade desejada depende de circunstâncias e momentos e se dá entre possibilidades e impossibilidades. Como num mundo onde se afirmam a igualdade de direitos de gênero e raça quer-se impor a maternidade obrigatória às mulheres?

ivone gebara religiosas pelos direitos

Nesses tempos de mares conturbados não há calmaria, não há possibilidade de se esconder dos conflitos, de não cair nos abismos das acusações e divisões sobretudo frente a certos problemas que a vida insiste em nos apresentar. O diálogo, a compreensão mútua, a solidariedade real, o amor ao próximo correm o risco de se tornarem palavras vazias sobretudo na boca dos que se julgam seus representantes.

Violência contra as mulheres em dados

Cfemea Perfil Parlamentar

Logomarca NPNM

Direitos Sexuais e Reprodutivos

logo ulf4

Cfemea Perfil Parlamentar

Informe sobre o monitoramento do Congresso Nacional maio-junho 2023

legalizar aborto

...